A literatura numa perspectiva histórico-cultural pode ser compreendida, de modo extensivo, como um campo constituído por práticas, tais como a leitura, a escrita e o exercício da crítica. Essas práticas, nas quais se articulam aspectos estéticos e éticos, comportam modos, suportes, gestos e sujeitos concretos, situados historicamente. Desse modo, poderíamos considerar as escritas de fãs, as fanfiction, das quais participam comunidades de adolescentes e jovens, seja na condição de autores, leitores ou críticos, e mesmo participando de mais de uma dessas atividades, como uma reedição das comunidades literárias, como os clubes de leitura, no contexto da “revolução eletrônica” que afeta profundamente as estruturas materiais do escrito e as maneiras de ler e escrever (Chartier, 1999). Acreditamos que o trabalho com a literatura com adolescentes, na escola, especialmente em relação às práticas de escrita literária, a que nos dedicamos nesse estudo, não pode desconsiderar essas questões e precisa buscar estabelecer relações com essas práticas criativas de escrita, leitura e crítica em contexto digital, levando assim, os alunos a perceberem a literatura como uma prática cultural circunscrita em um universo mais amplo, do qual eles também podem participar. A Olimpíada de Língua Portuguesa (OLP), em tese, favoreceria essa participação dos alunos na cultura literária, uma vez que se apresentam como um “concurso de produção de textos destinado aos alunos de escolas públicas de todo o país, do 5º ano do Ensino Fundamental ao 3º ano do Ensino Médio”, apropriando-se de uma prática das mais longevas do campo literário, haja vista a existência, desde a antiguidade clássica, dos concursos de tragédia e a permanência desses processos de seleção no sistema literário como forma de validação das produções literárias por critérios de qualidade estética. Nessa perspectiva, apresentamos uma reflexão sobre a escrita literária das Olimpíadas de Língua Portuguesa em contraposição às escritas de fãs, para refletir sobre a contribuição da OLP para a educação literária dos alunos do ensino fundamental, a partir das representações de literatura, práticas de escrita, leitura e crítica literária, dadas a ver em textos produzidos pelos alunos nas categorias poema (5º e 6º anos) e crônica (9º ano), nos materiais norteadores da seleção pelas instâncias avaliativas (comissões julgadoras municipais, estaduais, regionais e nacionais) e nos Cadernos do Professor que compõe a Coleção da Olimpíada. Para realização deste trabalho tomamos como referência as contribuições teóricas de Roger Chartier, especialmente as categorias representações, apropriações e práticas e suas reflexões acerca das práticas de leitura e escrita. Também nos apoiamos nos estudos de Catherine Tauveron que, a partir de pesquisas com escrita literária de alunos no ensino fundamental, na França, sistematizou o conceito de “aluno-autor” como aquele que estabelece uma relação estética com seus leitores, no âmbito da sala de aula.
Palavras-chave: ESCRITA LITERÁRIA, ENSINO FUNDAMENTAL II, OLIMPÍADA DE LÍNGUA PORTUGUESA