Anais
RESUMO DE ARTIGO - XV ENCONTRO ABRALIC
O CORPO DESSSACRALIZADO DE SAN JUAN DE LA CRUZ NA POESIA DE JORGE DE SENA
LUIZ FERNANDO QUEIROZ MELQUES
San Juan de la Cruz é um poeta místico espanhol do século XVI , cuja obra teve um controverso histórico de recepção. De um lado, as formas de sensorialidade e corporalidade aparentes na letra do poema e, por outro, a sublimação espiritual da experiência mística que guarda em si um longo percurso ascético de negação dos sentidos e do corpo. “Noite Escura”, “Cântico Espiritual” e “Chama de Amor Viva” compõem a tríade de seus poemas maiores e fazem parte do cânone teológico, como ilustres exemplos da doutrina cristã, e, mais tardiamente, do cânone literário, como textos poéticos abertos a diferentes leituras e interpretações. Em nossa pesquisa de mestrado, analisamos a presença de San Juan de la Cruz na obra da escritora portuguesa contemporânea Maria Gabriela Llansol e, neste trajeto investigativo, encontramos, pela literatura portuguesa da segunda metade do século XX, outros autores que trazem para o espaço da escrita o contato com o texto juancruciano e, principalmente, reelaboram uma imagem autoral do poeta místico a partir de diferentes traços difundidos por seu percurso de recepção. Com isso, interessa-nos, nesta comunicação, observar as configurações de autoria e autoridade estabelecidas nas relações intertextuais propostas pela poesia de Jorge de Sena, a saber, no poema “Diálogo Místico”, do livro Conheço o Sal... e Outros Poemas (1974), e nos poemas “S. Juan de la Cruz em Segóvia” e “Antonio Machado e S. Juan de la Cruz”, compilados na antologia póstuma 40 Anos de Servidão (1979). Estes poemas trazem à tona uma imagem dessacralizada do poeta místico que não tenciona rebaixar a poesia de San Juan de la Cruz, e sim, multiplicar seu transbordante potencial de sentidos pela abertura a uma leitura profana, pois como diz Maria Gabriela Llansol em O Livro das Comunidades: “A Viva Chama não foi escrita a frio, diz o Prólogo. Se as palavras têm um sentido: ultrapassa tudo o que se poderia conceber e estilhaça aquilo em que quereríamos encerrar” (1977, 1ªed., p. 29). O santo, retomado pela poesia de Sena, canta versos de “homem fêmea” e tem seu corpo mutilado para caber em um sepulcro. Os poemas senianos, segundo consta nas notas, foram escritos nas cidades de Ávila e Segóvia em viagens de Sena pela Espanha, de modo que configuram uma escrita de frequentação tanto do espaço místico-poético dos versos juancrucianos, quanto do espaço físico por onde havia passado o corpo histórico de San Juan de la Cruz quatro séculos antes. Como fundamentação teórica a este trabalho, contaremos com os estudos de Antoine Compagnon sobre autoria e intertextualidade e de Michel de Certeau sobre a performatividade do discurso místico.
Palavras-chave: INTERTEXTUALIDADE, POESIA MÍSTICA, LITERATURA PORTUGUESA, JORGE DE SENA
voltar