Anais
RESUMO DE ARTIGO - XV ENCONTRO ABRALIC
A MATERIALIDADE DA LINGUAGEM E A INSTABILIDADE DAS FORMAS -
MARIA DEL-VECCHIO BOGADO
Autora: Maria Bogado - Mestranda do programa Literatura, Cultura e Contemporaneidade da PUC-Rio. A partir de vídeos realizados por midialivristas nos protestos iniciados em junho de 2013 no Brasil, que perduraram por mais alguns meses em grandes cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, pretende-se pensar acerca de singularidades expressivas manifestas nessas ocasiões, notadamente nos momentos marcados pela tensão com as forças de repressão. O ponto central a ser destacado é a preponderância da materialidade da linguagem e da instabilidade das formas, perceptíveis tanto na intervenção sobre os lugares e corpos presentes nas manifestações, quanto nos arquivos dos registros audiovisuais ali produzidos. Nos vídeos, salta aos olhos a potência estética da má qualidade das imagens. A conturbação dos momentos em que eram produzidas, além das contingências técnicas, resultaram em imagens cuja suposta capacidade de transmissão neutra de acontecimentos era contundentemente refutada por camadas de pixels, borrões, estouros de luz e demais “falhas” que se impunham anarquicamente sobre as formas daquilo a que remeteriam. Nas imagens, observa-se que as distinções dos corpos entre si e em relação ao espaço, por vezes, eram momentaneamente suspensas. Também o som, notoriamente nos cantos e gritos de ordem, muitas vezes gerava camadas de indistinção entre esses elementos, de modo que mais do que um enunciador específico declarando palavras que remeteriam pura e simplesmente a significados claros, materializava blocos de ressonância que atravessam os corpos e o espaço, constituindo-se antes nessas passagens, no entre e no através. Utilizando-se de reflexões de Deleuze, Guatarri, Jean Luc Nancy e Georges Didi-Huberman, além de intercessores do campo literário, tal como Melville, pretende-se extrair dessa escrita audiovisual o sentido político do contato com essa materialidade inquietante, que permite a fuga a formas fixas e estáveis, assim como possibilidades de subjetivação que escapam à rigidez identitária e são marcadas pela abertura ao devir e ao contato com o outro. Para Nancy, se o som não é reduzido em prol da abstração semântica que propõe, pode ser encarado como uma potencialidade física, na qual não há distinção entre materialidade e sentido. O sentido passa a ser apenas a margem de um processo mais amplo de relações envolvendo o fator crucial da ressonância. Paralelamente, Didi-Huberman, em reflexões sobre o pensamento visual de Geroges Bataille, mostra que ao permitir-se o contato intenso com a materialidade da imagem, as abstrações formais são abaladas e o informe se dá a ver. Analisando o vídeo em fricção com esses pressupostos, restará saber, quando evidencia-se uma preponderância da relação copórea com a materialidade do som e da imagem, mais do que uma relação cognitiva com significados, que formas de vida são esboçadas ou indiciadas na fuga aos usos costumeiros da linguagem. Há, como na literatura de Melville, a intromissão de uma língua estrangeira no interior da língua, que põe em risco os seus alicerces e indica um fora? Procura-se, aqui, responder a essas questões e verificar como as descodificações e desterritorializações, operadas pelos manifestantes ao agirem como máquina de guerra, inscrevem-se em imagem e som nos registros audiovisuais.
Palavras-chave: JORNADAS DE JUNHO, MATERIALIDADE, INSTABILIDADE, SUBJETIVAÇÃO
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