LARISSA MOREIRA FIDALGO, JOSÉ LUIS JOBIM (ORIENTADOR DE MESTRADO)
Como objeto de construção de nossa experiência temporal, muitas são as tentativas de recuperar o tempo passado em sua totalidade e, assim, compreender o tempo presente. Entretanto, o que antes era considerado um corpo sólido capaz de ser traduzido em relato fiel, situa-se em um contexto mais amplo da crítica. Reconhecendo que o passado somente se presentifica como um relampejo em um momento de perigo que ameaça a tradição, como já advertira Walter Benjamin, a ficção contemporânea volta-se para as incompreendidas questões históricas a fim de compreender, ainda que de maneira fragmentada, os sistemas de signos que conferem forma a nossa experiência temporal. E é justamente nessa problemática da representação estruturada na relação básica entre o ato de narrar e o caráter temporal das experiências humanas que o presente trabalho encontra-se inserido. Evidenciando que o sentido do passado não está apenas nos acontecimentos, mas nos sistemas, como observara Paul Veyne, direcionaremos nossa atenção para as cenas de enunciação da ficção contemporânea. Ao inserir elementos históricos em seu universo ficcional, a literatura contemporânea questiona os pressupostos históricos de verdade e objetividade nos oferecendo uma rede de possibilidades frente aos paradoxos do tempo, ao invés de uma verdade totalitária. Esse retorno as sombras do mundo histórico pela ficção, discursos que durante muito tempo foram considerados em compartimentos estanques, só é possível a partir do momento que compreendemos uma relação de semelhança entre eles no que tange os caracteres estruturais comuns. Entretanto, como nos mostra Paul Ricoeur, não podemos negligenciar suas diferenças concernentes aos aspectos referenciais. E é isso que faz com que os discursos literário e histórico apresentem visões antagônicas a respeito do passado. Ao romper com a cadeia linear de causa-efeito-causa da rede conceitual das ações, o discurso ficcional opera uma trans-figuração das usuais características semânticas de nossa relação com o tempo. Reconhecendo a natureza indeterminada do conhecimento histórico, o discurso literário busca uma reorganização criativa e intransitiva de uma rede culturalmente histórica. Assim, através da análise do romance Nove noites, do brasileiro Bernardo Carvalho, observaremos a literatura não como apenas um corpo de obras, mas uma rede de significantes que assume diversos saberes. Corroborando a perspectiva do teórico Roland Barthes, para quem, a literatura não diz que sabe alguma coisa, mas que sabe de alguma coisa, poderemos concluir que o discurso ficcional, ao não garantir uma uniformização da dinâmica temporal, pode ser considerado uma dentre as inúmeras formas – quiçá a mais produtiva - de se compreender o sentido do ser e suas configurações.
Palavras-chave: METAFICÇÃO HISTORIOGRÁFICA, LITERATURA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA, HISTÓRIA, BERNARDO CARVALHO