Na condição de pesquisadores de literatura do presente milênio, movemo-nos por um solo avesso às fórmulas totalizantes e que abre caminho ao pensamento heteróclito. Tempo em que as rápidas transformações sociais, econômicas e culturais desafiam as matrizes binárias de acesso ao mundo e nos convidam a redefinir nossa prática, tornando-a, na medida do possível, uma abordagem multifocal. Para prosseguirmos, dessa maneira, nessa direção é fundamental resistirmos, por exemplo, ao que se essencializou na crítica como o modo de se pensar o latino-americano (a idéia de formação ancorada, por sua vez, no discurso do nacional). Partindo-se, então, da premissa de que a nossa época reorganizou, sobretudo através das várias metamorfoses do capital, as relações entre o nacional e o global; entre o público e o privado; entre o particular e o universal, parece-nos pertinente indagar o lugar da chamada produção simbólica nessa realocação de paradigmas. Nessa alçada, se a literatura no auge da modernidade foi uma das expressões dessas dicotomias, na cena do agora as tem problematizado, erguendo uma reconfiguração do espaço literário. Diante do exposto, nesta comunicação, propomos uma reflexão acerca das políticas de escritura que a literatura contemporânea tem se valido para elaborar as recomposições socioculturais do tempo (a nova indústria da informação; as mudanças da noção de cidadania; de identidade; de nação, etc.). Para tanto, analisaremos as obras Reprodução (2013), de Bernardo Carvalho e Los incompletos (2004), de Sergio Chejfec. Aquela nos permite, ao considerarmos a estrutura do texto um depoimento monolítico que traz à baila a fala praticamente ininterrupta de um internauta voraz, interrogar como a cultura da internet tem moldado, aparentemente, uma subjetividade outra. Dessa maneira, como se daria hoje a relação entre sujeito e conhecimento?Quais os limites entre a opinião e o saber?A internet remodelou as relações espaço-temporais? A enunciação hiperbólica do personagem possibilita-nos, assim, tais elucubrações que, em síntese, colocariam em evidência os processos de subjetivação/sociabilidade suscitados pelas redes/series/fragmentações da era digital. Por outro lado, esta, ao trazer uma narrativa que põe em cena um sujeito em trânsito, ou seja, um personagem nomeado como argentino, mas incapaz de reconhecer-se como um ser territorial, coloca-nos a pergunta acerca de como se perfila uma identidade não associada a um território nacional. Assim sendo, quais os sentidos que mobilizam a noção de um sujeito planetário que se constitui no fora de lugar/ no fora de pertencimento? Buscaremos, ao analisar as referidas obras, realizar uma leitura mais aberta a perguntas do que a respostas, conformadoras e unívocas.
Palavras-chave: BERNARDO CARVALHO, ERA DIGITAL, RECONFIGURAÇÕES SOCIOCULTURAIS, SERGIO CHEJFEC