Anais
RESUMO DE ARTIGO - XV ENCONTRO ABRALIC
O SERIAL KILLER COMO NARRADOR EM ZOMBIE, DE JOYCE CAROL OATES
LUCIANO CABRAL DA SILVA, LEILA ASSUMPÇÃO HARRIS
Os depoimentos de Adolf Eichmann na Corte Distrital de Jerusalém, segundo Hannah Arendt, revelam-nos que o mal pode ser tanto horrível quanto banal. Em 1961, o ex-oficial nazista foi julgado, considerado culpado pela morte de milhões de judeus e enforcado no ano seguinte. Como frisa Arendt, o tribunal montado em Israel evitava riscos políticos. Se Eichmann fosse julgado por uma corte internacional na Alemanha, ele poderia ter sido absolvido “por falta de mens rea”, ou seja, por que, psicologicamente, Eichmann não carregava qualquer peso na consciência. Seu perfil psicológico apontava para o fato de que o caso não era de insanidade moral ou legal, muito menos de ódio aos judeus. Inserido no cotidiano nazista, o ex-oficial alemão não constituía uma exceção de comportamento. Na verdade, ele “sempre fora um cidadão respeitador das leis” – e as ordens de Hitler igualavam-se a leis. A consciência de Eichmann somente pesava quando as ordens não eram cumpridas, ainda que estas fossem levar milhões para sofrer em campos de concentração. A conclusão de Arendt é a de que Eichmann era uma figura comum, de comportamento burocrático e submisso. Em seu julgamento, os promotores esforçaram-se em apresentá-lo como um monstro, pois este deveria ser o perfil do homem que comandou a endlösung. Entretanto, eles não obtiveram sucesso. O fracasso da promotoria deveu-se ao fato de que os depoimentos de Adolf Eichmann não passavam de “conversa vazia”. Este adjetivo qualificava a maneira enfadonha, repetitiva e repleta de clichês com que o ex-oficial se expressou ao longo de seu julgamento. O vazio nas palavras de Eichmann instalou então um descompasso: o conteúdo de seus depoimentos era horrível, mas a maneira como estava sendo contado era banal. O julgamento de Eichmann e as observações de Arendt ajudam-me a perceber que há uma estreita relação entre o que acontece e o relato deste acontecimento (entre o que os teóricos formalistas chamaram de fábula e enredo, respectivamente). É neste vão entre fábula e enredo que eu pretendo posicionar minha apresentação. Interessa-me analisar a narrativa do serial killer enquanto produtor e transmissor do horror (um horror artístico) que ele mesmo inflige, daí a necessidade de sua narração ser autodiegética. As obras ficcionais de crime têm frequentemente utilizado informações sobre matadores seriais reais para compor suas tramas. Entretanto, assim como Eichmann, o comportamento deste criminoso real é tão trivial e suas motivações tão banais, que ele se torna ineficiente como narrador de seus próprios atos horríveis. Para que eventos e relatos tornem-se igualmente horríveis, suponho que seja preciso alinhá-los. Isto implica dizer que a narrativa deve afastar-se da monotonia discursiva do serial killer real. Há romances, entretanto, que optam por manter esta monotonia discursiva, como parece ser o caso de Zombie (1995), de Joyce Carol Oates. Se é correto afirmar tal coisa, como este assassino ainda mantem (se é que mantem) seu caráter horrível? Explorar as estratégias narrativas desta obra parece ser o caminho para responder a esta pergunta.
Palavras-chave: HORROR, SERIAL KILLER, ZOMBIE, JOYCE CAROL OATES
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