Torquato Neto é um poeta singular na literatura brasileira. Talvez porque ele não tenha sido apenas poeta: também foi jornalista, roteirista, compositor de música popular brasileira, participante ativo na escrita de manifestos do Tropicalismo, dirigiu e atuou em filmes Super-8, foi um agitador da cena cultural de sua época. Talvez porque a sua obra seja amplamente fragmentária e convulsionada; escrevia desde os nove anos de idade; tinha cadernos de restos de textos não publicados, diários produzidos dentro e fora dos manicômios pelos quais passou. Talvez porque sua vida de poeta se confunda com o período histórico de ditadura civil militar em que se situa – conturbado, violento, permeado por morte, por catástrofes e ruínas –, do qual não podemos e não devemos separar sua obra. A produção de Torquato Neto também é um meio de conhecimento da experiência histórica vivenciada por ele e por seus contemporâneos e dos desacertos do país. Fazer uma sondagem da sociedade brasileira a partir de produtos culturais, além de funcionar como documento de memória, leva-nos a reconhecer quais as formas que Torquato procura nessa complexa matéria. Mostrar como suas intenções artísticas se traduzem em linguagem artística, bem como as ambiguidades e contradições podem servir como um sismógrafo tanto dos movimentos artísticos do poeta como das mudanças ocorridas no país e os sentimentos daqueles que estavam envolvidos naquela experiência histórica e tinham expectativas relacionadas ao desenvolvimento do Brasil. Neste cenário, nossa hipótese é de que a melancolia funcione como um mecanismo de resistência aos acontecimentos da época, contra a vertigem da violência e uma reação contra o presente que se mostra inapropriado e que não demonstra possibilidade de continuação que não seja barrada pelas ações do tempo. A melancolia que seria a priori vivenciada no íntimo do indivíduo explode para uma extensão social a partir do chamado ao outro para ocupar espaços, saindo da experiência particular para a experiência coletiva, ambos – indivíduo e coletivo – vivendo à beira da dissolução. Sua obra surge como uma resistência melancólica, como uma resposta ao não esquecimento do que estava acontecendo no país, da densa e complexa realidade que tomava conta dos espaços públicos e privados, mas sem superação das perdas e sim as reconhecendo. Resistência ao mundo que desaparecia, não só o mundo dos avanços culturais e sociais como também o mundo da infância que ficou para traz, numa triste Teresina, sabendo de antemão que os caminhos da vida seguiam em direção à morte, o que não deixa de ser paradoxal, já que caminha para o fim, deixando seus escritos como escapes, como meio sobrevivente. Sua atitude transgressora vai se mostrar na violência das formas, na escolha das palavras, na forma como trata o leitor, e pretendemos analisar e interpretar sempre numa perspectiva que leva em conta o contexto histórico cultural. A essa postura do poeta o resultado de uma perda afetiva que ultrapassa o afeto individual, transbordando para os acontecimentos históricos, o afastamento do exílio, o desaparecimento da infância, na sua perspectiva fracassada de adulto.