Anais
RESUMO DE ARTIGO - XV ENCONTRO ABRALIC
A FICCIONISTA, OU CERTA FICÇÃO DE ACADÊMICOS
MÁXIMO HELENO RODRIGUES LUSTOSA DA COSTA, LÍVIA REIS
Nosso objetivo é apresentar uma leitura de A ficcionista (2013), de Godofredo de Oliveira Neto, tentando localizá-la como “obra ficcional produzida por acadêmicos”, neste caso, considerando que esta segmentação é determinante para caracterizar um tipo de literatura, em destaque já há muito tempo, que acreditamos se encaixa no que Josefina Ludmer aponta sobre as narrativas contemporâneas: “insistem o tempo todo em dizer ‘sou literatura’ e representam, quase sempre, algum escritor ou alguém que escreve em seu interior” (LUDMER: 2013, p. 77). A ficcionista inscreve-se neste panorama, mas de uma forma que acaba por ironizar o próprio processo deste tipo de construção ficcional, quer dizer, desta ficção que, a exemplo de Ricardo Piglia (Respiração artificial, 1980), Silviano Santiago (Em liberdade, 1981) ou Vila-Matas (El mal de Montano, 2014), se põe a discutir o narrador, a memória, a autoria, a representação, a resenhar outras narrativas, etc., ou seja, todo o arsenal que a crítica literária desenvolveu para discutir seu objeto: a literatura. Lemos um romance que já traz em si o receituário acadêmico. Pensamos que tais ficções sejam desdobramentos das ideias de Walter Benjamin, no que diz respeito, principalmente, à impossibilidade das grandes narrativas dentro dos moldes tradicionais – tradicionais para Benjamin, esteja claro – numa realidade prenha das imagens recentes e traumáticas da guerra (BENJAMIN, 1933). Daí, decretando-se o fim da possibilidade das grandes histórias, porque as grandes experiências não são mais traduzíveis às palavras, só restaria ao escritor a alternativa de tratar das pequenas histórias e, em extremo, da história da construção das pequenas histórias. Apesar do diagnóstico e consequente vaticínio benjamiano, não estamos convencidos de que o narrador “morreu” nem aqui, Brasil-América Latina, região cuja a oralidade foi até bem pouco tempo a única forma de transmissão de experiência para a maior parte da população, nem mesmo na Europa, como acreditamos que Los girasoles ciegos (2004), do espanhol Alberto Méndez, seja exemplo suficiente. Entendemos que esta assertiva foi assumida ipsis litteris sem o desconto do impulso retórico que seu dramático contexto histórico incutia e, neste sentido, valeu-se também de um processo de reprodução feito para confirmar a assertiva. Na contramão do fim das grandes narrativas, no Brasil, podemos citar os clássicos Grande sertão: veredas (1956), Quarup (1967), Viva o povo brasileiro (1984) e, mais recentemente, Cidade de deus (1997), de Paulo Lins. Para problematizar ainda mais tais ideias, pensamos nas literaturas pós-eventos traumáticos, ou seja, na literatura produzida em cima da memória/ficção sobre a Shoah, na Europa, e as ditaduras militares na América Latina. Desta forma, lemos o livro do professor Godofredo de Oliveira Neto como uma contundente crítica ao que, de alguma maneira, virou o novo mote narrativo: não havendo nada de relevante para contar, dediquemo-nos a destrinchar as partes que compõem o contar. Pensamos que, se em determinado momento, tal estratégia poderia ser inovação revolucionária, porém, transformada em macete, desdobra-se em clichê e diminui a parte do espírito que existe em toda a obra de arte.
Palavras-chave: GRANDES NARRATIVAS, NARRATIVAS CONTEMPORÂNEAS, CRÍTICA LITERÁRIA
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