Anais
RESUMO DE ARTIGO - XV ENCONTRO ABRALIC
UMA INVESTIGAÇÃO SOBRE OS CONTORNOS DO HUMANO N"O REINO DE GONÇALO M. TAVARES
RENATA QUINTELLA DE OLIVEIRA
Este trabalho tem por objetivo investigar os contornos do humano na tetralogia O Reino, do escritor português contemporâneo Gonçalo M. Tavares. Esta série de livros, também denominada pelo próprio autor de “Livros Pretos”, traz, além das capas negras (apenas presentes nas edições portuguesas), formas e conteúdos um tanto sombrios. É composta pelos romances Um homem: Klaus Klump, A Máquina de Joseph Walser, Jerusalém e Aprender a rezar na era da técnica. Nosso foco recairá sobre a caracterização de alguns personagens da tetralogia e, especialmente aqueles que, a princípio, poderiam ser classificados como “vilões”, embora tais nomenclaturas sejam, obviamente, redutoras. A ausência de empatia, também predominante nestes textos, caracteriza o que Hannah Arendt define como a “banalidade do mal”. “Para que Auschwitz não se repita”, como queria Adorno, é necessária essa “inflexão em direção ao sujeito”. É necessário mergulhar na perversidade dessas mentes que emblematizam, de maneira mordaz, aquelas que, na História da Humanidade, arquitetaram a construção de algo tão terrível como um campo de concentração/extermínio nazista, como o de Auschwitz. Mas o Mal não reside apenas nas mentes e atitudes daqueles que detêm o poder ou que se encontram no “lado forte”. Com a leitura atenta d’O Reino, constata-se que o Mal impera em todos os âmbitos e de maneira injustificada e incômoda. É difícil diferenciar algozes e vítimas, bons e maus, em meio a um panorama de destruição, no qual Deus está ausente, assim como qualquer outra entidade que pudesse conduzir o Homem à sua salvação. Segundo Jean-François Mattei, é, justamente, a “erradicação da transcendência” que conduzira o homem à desumanização. Na chamada “era da técnica”, proposta pelo autor e até mencionada no título do último romance da tetralogia, tem-se a predominância da lógica da máquina, que se sobrepõe ao próprio Homem. Presente de maneira profunda na composição dos quatro textos, embora muito mais evidente em A Máquina de Joseph Walser e em Aprender a rezar na era da técnica, este é um dos fatores que desencadeiam a desumanização n’O Reino de Tavares. Muitos personagens não apresentam simplesmente uma submissão à máquina, mas interiorizam seus atributos. Assim, notamos que até mesmo os sentimentos são, agora, “maquínicos”. Joseph Walser, protagonista do segundo volume da tetralogia, sente uma “melancolia infiltrada nos sentimentos da eficácia”. Alia-se a essa discussão, também, uma outra, igualmente importante: o questionamento acerca dos avanços técnicos (de maneira mais ampla), que, desacompanhados de avanços éticos, conduziram o homem a uma espécie de abismo criado por ele mesmo, ao invés de conduzi-lo à felicidade. Todos esses questionamentos convergem, no entanto, para o nosso enfoque primeiro, proposto neste trabalho: a indagação a respeito dos contornos da natureza humana.
Palavras-chave: DESUMANIZAÇÃO, GONÇALO M. TAVARES, LITERATURA E MAL, PERSONAGEM
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