Esta comunicação tem como objetivo explorar a estruturação temática do romance Jerusalém, do português Gonçalo M. Tavares, que se divide em dois núcleos centrais: o da loucura e o da violência, tendo ainda um terceiro que subjaz a toda a obra que é o da conduta ética e moral. Povoada por personagens assoladas pelo horror do pós-guerra e das marcas deixadas pelo “breve século XX”, conforme a nomenclatura do historiador Eric Hobsbawm, a obra expõe um verdadeiro mostruário da barbárie em cada uma de suas figuras, que além de possuírem doenças mentais são portadoras de deformidades físicas que as desabilitam a uma vida dentro de padrões de normalidade. Para esta exposição, no entanto, focar-nos-emos, em um dos protagonistas da narrativa que é o médico Theodor Busbeck, um cientista tomado por uma pesquisa insana que busca medir o horror praticado na História numa escala temporal, objetivando previsões futurísticas ligadas a uma cartografia mundial na qual diferentes países seriam responsáveis por subjugar outros. Utilizando-se de dados estatísticos e matemáticos, o cientista tem o intuito de apresentar o embate entre a força, entendida “como matéria com energia para pôr em perigo outra matéria”, e a fraqueza, “matéria com energia vazia, sem possibilidade de colocar em perigo outra matéria próxima” apresentando os povos que, nos séculos seguintes, seriam em alguns momentos fortes e, em outros, fracos e, como numa “profecia numérica”, poder mensurar e prever o horror a ser cometido em escala mundial. Nessa pesquisa, Theodor avalia que a História individual e coletiva caminham para o equilíbrio entre o sofrer e o fazer sofrer, vivendo o mundo um grande conflito entre cargas positivas e negativas que só chegaria ao fim quando atingisse o zero, ou seja, a anulação de ambas as forças. A personagem é caracterizada de forma bastante curiosa, tendo uma atração profunda pelo tratamento da loucura através da normatização do comportamento do anormal, que, segundo suas teorias, ao ter seu pensamento e atitudes previstas, poderia ser controlado. Segundo a narrativa de Jerusalém, a intenção de Theodor é ir da previsão da História individual para o prognóstico da História coletiva, traçando, no percurso dos séculos, uma normalidade para, assim, a poder controlar. Ao procurar conhecer a saúde mental da História e compreender o seu “raciocínio”, a personagem tenta encontrar o que designa como “normalidade espiritual”, ou seja, a substância desconhecida do homem mas que lhe falta, que lhe “é roubada”. Tratando da banalidade do mal, Gonçalo Tavares elabora, em seus Livros negros, um verdadeiro tratado ficcional que busca compreender as causas da maldade “que existe sem o medo, quase não humana porque não justificada”.