Em Verdade Tropical (1997), Caetano Veloso faz uma narrativa de cunho autobiográfico sobre o movimento tropicalista, selecionando, para tanto, um conjunto de eventos e personagens emblemáticos que estruturam seu relato. Nesse sentido, é importante observar que o cantor e compositor Roberto Carlos aparece como peça fundamental do processo narrado, sendo incorporado em sua dimensão mítica de representante maior da cultura de massas no Brasil dos anos 1960, especialmente no campo musical. Caetano também usou o ícone Roberto Carlos em canções fundamentais do tropicalismo (como “Baby” e “Tropicália”), em um processo de caráter antropofágico de grande relevância para as discussões do livro. Além disso, Caetano teve três canções gravadas por Roberto (que foram compostas especialmente para ele) - "Como dois e dois", "Muito romântico" e "Força estranha" -, todas de natureza metalinguística, refletindo sobre a canção e sobre o próprio ato de cantar. Nelas, evidenciam-se deslizamentos e ambiguidades entre o romântico e o político, que caminham no sentido de revelar a centralidade da canção popular no Brasil, como forma de expressão privilegiada de um fazer artístico, a um só tempo, de alta qualidade e de alta abrangência comunicativa. Insinua-se aqui, em alguma medida, a concretização da utopia oswaldiana de dar às massas um "biscoito fino", o que se realiza mais completamente, não na esfera da literatura, mas justamente no âmbito da canção popular, revelando a potência cultural desse gênero e propiciando a reflexão sobre suas implicações políticas e sociais. O presente trabalho pretende mostrar como Caetano Veloso se vale do ícone Roberto Carlos no intuito de iluminar essas questões.