O presente trabalho analisa – com a sustentação teórica fornecida pelas ideias da Análise do Discurso inspiradas no pensamento de Mikhail Bakhtin – as obras, Diário do Hospício, de Lima Barreto e Memórias do Subsolo, de Dostoiévski. Nele busca-se avaliar como as narrativas desenvolvidas por esses escritores constroem uma crítica contundente aos valores hegemônicos presentes em suas respectivas sociedades. Ao mesmo tempo, o estudo defende a ideia de que a crítica empreendida através das narrativas dos autores converteu ambos em grandes intérpretes do espírito de suas épocas. Mesmo tendo vivido e produzido em momentos históricos e culturais distintos, pode-se dizer que há entre os discursos de Lima Barreto e Dostoiévski – guardadas as devidas proporções – uma aproximação intelectual e artística. Tal aproximação se dá de modo específico pelo fato de os escritores efetuarem uma “radiografia” detida e apurada dos tipos humanos social e historicamente definidos, conseguindo apresentar um apanhado bastante significativo dos anseios, dúvidas, dramas, paixões, grandezas e misérias de homens e mulheres de seus tempos e culturas. A investigação empreendida organiza-se em torno da hipótese geral de que tanto Lima Barreto, no Brasil, quanto Dostoiévski, na Rússia, se instituíram, a partir do legado literário por eles produzido, como intelectuais dissonantes. É importante ressaltar que, a categoria “dissonante” aqui é tomada como o conjunto de artistas e intelectuais que, além de analisar de maneira profunda e intensa as questões primordiais de determinada época, construíram uma crítica contundente aos valores hegemônicos nela presentes. Ao mesmo tempo em que se buscou analisar as obras selecionadas, partindo da premissa geral exposta, procurou-se também avaliar como os discursos dissonantes de Lima Barreto e de Dostoiévski produzidos, respectivamente, no Brasil do início do século XX e na Rússia da segunda metade do século XIX nos chegam neste início de século XXI.