Das epopéias gregas à ficção científica, o insólito está representado na literatura em narrativas que transgridem, em variados níveis, concepções preestabelecidas do que consideramos real. Tais relatos nos remetem ao fantástico e ao maravilhoso, são histórias repletas de magia ou eventos extraordinários e sobrenaturais. Um dos recursos recorrentes em narrativas fantásticas é a aparição de seres que retornaram da morte e estão a vagar entre os vivos. Para essas entidades não se aplicam as percepções que temos de tempo e de espaço. Propomo-nos, com este artigo, a analisar alguns dos aspectos referentes ao cambiante ponto de vista das almas penadas que povoam Pedro Páramo, romance escrito pelo autor mexicano Juan Rulfo, considerado um dos precursores do Realismo Mágico e do "boom" dos escritores latino-americanos que ocorreria na década de 1960. Para Robert Scholles e Robert Kellogg, o controle da ironia narrativa, que acontece através da disparidade de compreensão entre personagens, narrador, leitor e da distinção entre o narrador e o autor, é a principal função do ponto de vista. É por meio do cambiante ponto de vista dos narradores defuntos de Comala, cidade fantasma criada por Juan Rulfo em Pedro Páramo, que o autor mexicano tece uma narrativa em que os limites entre vida e morte, real e ilusório, se rompem.