O livro de contos Faca se inscreve numa tradição literária oral própria ao Nordeste, lembrando a literatura de cordel, uma forma da literatura “de colportagem”, próxima à “chanson de geste” medieval e ao movimento armorial. O Nordeste, nos livros do escritor Ronaldo Correia de Brito, nascido no Ceará, não é apenas o teatro das narrativas como fonte de inspiração das histórias, cujos personagens são ligados a uma sociedade patriarcal, profundamente religiosa e tradicionalista. Os elementos narrativos pertencem também ao fantasmático, ao inexplicável, ao onírico e à pulsão, formas modernas e subvertidas do sagrado e da magia. Com certo lirismo sóbrio, Faca descreve um mundo submetido até a tensão extrema à Lei, fazendo dialogar com trágico duas vertentes: o feminino e o masculino. O escritor observa o quotidiano, os costumes e o ambiente, ocorrendo no sertão dos Inhamuns, vivendo dramas humanos, e atingindo, desta forma, o mito universal. Este livro tão singular é traduzido na França pela Editora Chandeigne, com meus cuidados, e será lançado em 2013. Nesta apresentação, tentarei mostrar como este universo regionalista, com extrema sofisticação formal, e tom bíblico de alto teor literário, foram transpostos para a língua e cultura francesa. Quais foram os principais desafios diante de uma prosa densa remetendo à região do Nordeste, que na França, também chama atenção por ser emblemática de um país? Portanto, este livro inscreve-se, do ponto de vista francês, dentro um painel mais amplo e mal conhecido que é a Literatura brasileira.