O impedimento ao luto leva a uma repetição negativa, no sentido da psicanálise
freudiana, encarada como um sintoma de algo que está recalcado, algo de que, no fundo, não se
quer lembrar, mas cujo esquecimento forjado não é real. Essa memória impedida é o principal
tema de “Ainda estou aqui”, de Marcelo Rubens Paiva. Não o desaparecimento de Rubens
Paiva, pai do autor; não seu sequestro, tortura e assassinato na sede do Dops, no Rio de Janeiro;
não o atestado de óbito sem corpo, muito tardio, ou a descoberta, mais tardia ainda, de que esse
mesmo corpo que nunca houve teve, na verdade, os restos atirados ao mar. No livro, a vítima
primeira é a memória.