A literatura sempre teve uma relação tensa com a escola. Enquanto, de um lado, a função formadora tem motivado sua inserção nos currículos, de outro, o uso pedagógico daí decorrente parece conspurcar seu valor estético. A situação se agrava quando obras criadas especialmente para fins pedagógicos aspiram à condição de literatura, independentemente de sua finalidade original. É o que tem ocorrido com a literatura infantil e juvenil. Atualmente, parece haver consenso entre os especialistas que a boa literatura para crianças e jovens é mais emancipadora (entenda-se, crítica) quanto menos pedagógica, ainda que sua natureza emancipadora a credencie para uso escolar. Trata-se de um paradoxo que pode ser mais claramente observado na chamada literatura juvenil, que por se dirigir a um público mais maduro nem sempre tem sua especificidade reconhecida. Aliás, sua própria designação tem sido discutida pelos estudiosos, embora seja largamente utilizada pelo mercado editorial, por escritores, pela escola, pelas bibliotecas, pelos leitores, pelos “guias de leitura” e por instituições que premiam obras desse subgênero literário. Para aprofundar a discussão da suposta especificidade da literatura juvenil, esta comunicação propõe-se comparar os livros A órbita dos caracóis (2003), de Reinaldo Morais, e Se eu fechar os olhos agora (2009), de Edney Silvestre. Esses livros têm em comum a possível destinação ao público juvenil. Trata-se de aspecto relevante para a discussão porque, embora os livros apresentem vários pontos em comum com o chamado subgênero juvenil, seus autores não os consideram como tal. Conforme depoimento de Reinaldo Morais, seu livro teria sido trabalhado como romance juvenil pela editora à sua revelia, enquanto que, no segundo caso, nem autor nem editora cogitaram em tal filiação, tendo o livro recebido o prêmio Jabuti como melhor romance de 2010. Fica, assim, levantado um problema, cuja discussão pode contribuir para lançar luz sobre a possível especificidade desse subgênero literário e, ao mesmo tempo, colocar em outras bases o paradoxo do uso pedagógico da literatura.