Quando Manuel Bandeira organizou a Antologia de poetas brasileiros bissextos contemporâneos (1946), fez constar naquela coletânea poetas notáveis e inéditos em livro – a exemplo de Joaquim Cardozo e Dante Milano –, mas também autores diversos, cuja produção é associada a outros ramos do saber, tais como: Afonso Arinos de Melo Franco, Aurélio Buarque de Holanda, Rodrigo Melo Franco de Andrade, Francisco de Assis Barbosa e Gilberto Freyre. É na companhia desses autores que o antropólogo pernambucano confiou a publicação do poema “Bahia”, subintitulado “Bahia de todos os santos (e quase todos os pecados)”, que veio a ser seu título posteriormente, já que o poema é datado de 1926. Sendo este o batismo poético do autor de Casa-grande e senzala (1933), a poesia que salta de sua prosa adquire outra feição a partir daí e se constitui como objeto autônomo em 1962, quando da publicação do volume Talvez poesia, do qual destacaremos alguns poemas para ilustrar o perfil de poeta que se limita com o do reconhecido prosador do Recife. Como o livro de poemas só foi reeditado em 2012, será esta a edição a ser compulsada, tanto por incorporar poemas que não constavam na primeira edição e que foram coligidos posteriormente – ampliando sua compreensão de poeta –, quanto pelo fato de que tal ampliação confere outro sentido ao objeto que é aquele livro, uma vez que passa a dispor de uma outra configuração física, que se constitui das seguintes partes: 1. Prefácio de Ledo Ivo; 2. Prefácio do autor; 3. Brasiliana: litoral e sertão; 4. Encanta moça e outros encantamentos; 5. Agosto azul e outros poemas europeus; 6. África & Ásia; 7. Soneto de colegial; 8. De pai para filha; 9. Versos para Ana Cecília e outros poemas; 10. Bibliografia de Gilberto Freyre. A numeração assim disposta não está grafada no livro e se está aqui sugerida é só para dar a dimensão de que o volume permite sua compreensão autonomamente como uma chave de leitura possível, através da inter-relação de suas partes, que devem ser acrescidas da “Nota explicativa” no início do livro, bem como a dedicatória a Carlos Drummond de Andrade, que, àquelas alturas, já era um poeta nacional. Se num primeiro horizonte de leitura, abre-se a possibilidade de abordar o volume no entrelaçamento de suas partes, estas mesmas partes se enredam em outros livros do autor, possibilitando um diálogo entre os seus livros com vistas a uma configuração mais ampla de sua obra, noutro horizonte de leitura. Senão, ao menos, oferece-nos algo que se aproxime de um estilo – com vocabulário, ritmos e temas próprios que apontam para o delineamento de um sujeito poético – e que se estende para sua produção num sentido mais amplo, uma vez que está grafado no espaço da página, seja quando lemos sua poesia ou quando a confrontamos com outra parte de sua produção literária, ensaística ou ficcional. Outro não será o objetivo aqui, senão o de traçar linhas para o esmiuçamento do sujeito Gilberto Freyre como uma persona literária.
Palavras-chave: LITERATURA BRASILEIRA, LITERATURA COMPARADA, GILBERTO FREYRE