ELISÂNGELA DE LANA COSTA, TEREZINHA TABORBA MOREIRA
Faltava na literatura canônica a promoção da visibilidade política das mulheres, já que a vida delas era mal representada ou simplesmente não representada. Diante disso, é importante dar visibilidade à literatura de autoria feminina atual. Assim, torna-se indispensável mostrar a escrita de duas mulheres com sua visão no que diz respeito aos costumes e às relações de gênero no meio em que vivem. Para isso, serão ressaltados como se estrutura a obra e como nela se inscrevem imagens relacionadas ao gênero que fazem parte da vida psíquica dos indivíduos brasileiros e moçambicanos, com sua subjetividade, contribuindo para a rasura da perpetuação de uma escrita e de costumes, preceitos e tradições etnocêntricas hegemônicas. Nesse contexto, este estudo tem como objetivo comparar como as autoras Conceição Evaristo, brasileira, com a obra Ponciá Vicêncio (2003), e Paulina Chiziane (moçambicana), com a obra O alegre canto da perdiz (2008), questionam a inserção da mulher negra na sociedade. Será abordado como as duas autoras, em vez de abordar a mulher como objeto, abordam-na como um sujeito ciente de sua identidade e reflexivo em relação à sua história em uma sociedade que a exclui. Uma atitude importante de ambas as autoras é questionar a homogeneidade dos valores patriarcais. Será realçado como as personagens Ponciá Vicêncio e Delfina analisam a opressão delas como mulheres negras na sociedade a que pertencem e que deve valorizar os direitos humanos e se opor à dominação cultural feminina. Serão ressaltados os mecanismos de resistência social de Ponciá e Delfina, como, por exemplo, através da reflexão, tentam se constituir como sujeito. O relacionamento amoroso em ambas as narrativas acaba sendo símbolo de dor. Há vários questionamentos por essas personagens ao tentar fazer parte da sociedade, vivendo de forma digna, mas são vítimas de um sistema que não as inclui. Ponciá, por exemplo, sonha com uma vida autônoma, independente, em ter casa própria, e a única moradia que consegue comprar é um barraco na favela. Ao sentir-se excluída a cada dia, encontra como resistência o silêncio, mas não deixa de refletir sobre tudo a sua volta; já Delfina decide ser assimilada, atitude que também não é bem aceita pela família, já que terá de renegar a sua origem. Com essa atitude de trazer essas mulheres consideradas à margem da sociedade machista e de exclusões para o centro de suas obras literárias, as autoras transgridem em suas narrativas, rompendo com o cânone masculino, e fragmentam as fronteiras sociais, colocando os homens que estão próximos a essas personagens como oprimidos, sendo vistos também como vítimas de um sistema que os escraviza e oprime.