Anais
RESUMO DE ARTIGO - XV ENCONTRO ABRALIC
A TEMPORALIDADE PROVISÓRIA DO ESTÉTICO COMO PERFORMANCE
MARIANA LAGE MIRANDA
Em torno do final da década de 1970, o filólogo suíço Paul Zumthor alterou a direção metodológica de suas pesquisas em torno da poesia oral medieval: de uma perspectiva estruturalista e semiótica a uma abordagem mais diversificada e abrangente, que incluía contribuições da antropologia, etnografia, linguística, fenomenologia e estética. Ao analisar diversas formas contemporâneas e arcaicas de comunicação poética oral em redor do mundo, ele compreendeu o caráter essencialmente corporal, dinâmico e movente da forma poética. Tendo como objeto de pesquisa poesias da Idade Média secular, da África Ocidental, do sertão brasileiro, do folk norte-americano, dos nômades do Saara aos maori da Nova Zelândia, Zumthor reconheceu que, mais do que oralidade, tratava-se de falar em vocalidade, assumindo o aspecto de ação e engajamento corporal envolvidos na comunicação poética. Ao destacar, deste modo, a corporeidade das produção, transmissão e recepção da poesia vocal, Zumthor utiliza a noção de performance para compreender um fenômeno sobretudo fugidio, evanescente, reiterante e sempre movente: a poeticidade como corporeidade, ou ainda, o fato de que a forma da poesia somente surge no momento aqui agora de uma percepção em copresença entre poeta, poesia e público. O aparecimento deste conceito em Zumthor marca também a ousadia do autor em propor que a teoria literária, a análise estética e a filologia tratem de seus objetos de pesquisa de forma mais aberta e sobretudo menos totalizante, permitindo, deste modo, que as ciências humanas exercessem, como dizia, um pouco mais de “imaginação crítica”. Embora para Zumthor a performance advenha das pesquisas etnográficas e do folclore, é possível perceber contribuições da performance como poética artística contemporânea, demonstrando que uma abordagem performativa da arte e da literatura, essencialmente corporal e contingente, se situa para além das dicotomias, tais como real e representação, arte e vida, significado e superfície, forma e conteúdo. Nesta perspectiva, a forma estética/poética, entendida como performance, somente vem a ser enquanto um instante – dependente da contingência aqui e agora de um corpo (copresente ao performer e ao poeta) que percebe. Em outras palavras, a forma estética e/ou poética é um acontecimento; um acontecimento que se forma e/ou conforma no mesmo instante em que se retira e desvanece, permanecendo como forma estética-poética apenas para uma percepção e uma experiência. Desta forma, o trabalho não só analisa o papel preponderante da performance nas pesquisas de Zumthor, como destaca as contribuições recíprocas entre uma estética do performativo (tanto na Estética quanto na teoria literária) e as artes contemporâneas. Em última instância, visa-se apreender, com o conceito de performance de Zumthor, a qualidade mesma do estético (e da forma poética) como acontecimento, instante e movência.
Palavras-chave: PERFORMANCE, ESTÉTICA, PAUL ZUMTHOR, EXPERIÊNCIA ESTÉTICA
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