Compreendemos que o discurso literário é voz que integra uma comunidade discursiva. O discursivo aqui, que caracteriza essa comunidade, e? visto como interlocuc?a?o que se estabelece entre os sujeitos, como ac?a?o partilhada que os conduz a questionamentos. Assim, entendemos que o discurso litera?rio integra essa comunidade de comunicação enquanto voz que se manifesta sobre ela e seus temas, como voz ativa de um sujeito integrante de uma comunidade, que fala da mesma e para a mesma. Trata-se, portanto, de uma voz que vem permeada por discursos diversos e que irá, ademais, desencadear outros discursos, promovendo inúmeros diálogos na comunidade que o recebe. Dessa forma, o discurso litera?rio não se encerra em si mesmo, podendo ser inclusive definitivo na efetivação de conexões com outros universos discursivos. A partir desse entendimento, propomos uma reflexa?o que procura investigar a participac?a?o da produc?a?o litera?ria existente no grande discurso que se estabelece em uma comunidade que na?o mais se limita a?s fronteiras nacionais, mas sim que pode ser compreendida como uma comunidade discursiva mundial. Procuraremos demonstrar, enta?o, como o discurso litera?rio pode ser visto como um medium que, ao fazer uso da linguagem natural e dar-se nas dina?micas desta linguagem, pode ser capaz de incorporar e incentivar transformac?o?es na realidade extralitera?ria, desde quando se trata do indivi?duo leitor e a ampliac?a?o de sua visa?o de mundo ate? a possi?vel transformac?a?o de espac?os sociais. Esse medium, então, não é visto apenas como simples instrumento, mas como ambiente onde se constrói uma espécie de realidade ficcional capaz de dialogar com a realidade extraliterária. Em vista da discussa?o de natureza teo?rica brevemente exposta, propõe-se observar tais dinâmicas em diálogo com Gato preto em campo de neve (1941), a primeira narrativa de viagem de Érico Veríssimo (1905-1975), publicada após sua primeira estadia nos Estados Unidos, a qual oficializa a participação do escritor na política de Boa Vizinhança estadunidense instituída entre os anos 1933 e 1945 com os países da América Latina. Para tanto, não só trataremos de Gato preto em campo de neve em interface com esta política específica, destacando os potenciais de diálogo entre o discurso literário e o discurso extraliterário, mas procuraremos também destacar o lugar político exercido por Érico Veríssimo neste contexto, que, a nosso ver, é definitivo para a construção de sua posição de intelectual ao longo da carreira. Além da investigação de cunho teórico que se volta aos interesses mencionados, procuraremos também observar como é possível apontar para a revalorização não só da obra literária no amplo debate que se estabelece em uma comunidade de comunicação, mas também do papel do escritor enquanto intelectual não somente através de sua produção literária, mas especialmente graças a ela.
Palavras-chave: ÉRICO VERÍSSIMO, DISCURSO LITERÁRIO, ESTADOS UNIDOS, POLÍTICA DE BOA VIZINHANÇA