A partir das análises fílmicas do protagonista de O Livro das Ilusões, romance de Paul Auster, o presente estudo pretende estabelecer algumas questões acerca da intermidialidade entre o cinema e a literatura. Conhecido por suas incursões em diversos meios, Auster sempre explorou as possibilidades dos intervalos entre um meio e outro. Com apoio de textos sobre intermidialidade, história da arte e teoria crítica, este artigo procurará explicitar estratégias utilizadas por Auster neste romance, seus efeitos e consequências. Em seu inspirado artigo “O que significaria intermediações culturais”, Costa Lima parte para uma investigação que se pautaria pelos parâmetros do próximo e do distante, chegando à conclusão que a teoria seria um “próximo-distante” da cultura. O professor Claus Cülver, da Universidade de Indiana, especialista em intermidialidade, parte de diferentes conceitos de mídia para concluir que “a determinação da mídia é um ato interpretativo que antecipa a interpretação do texto”, e que a qualificação de um texto, ou em outros termos, uma configuração da mídia, depende também de contextos, convenções e práticas culturais. Mais próximo da nossa discussão, no entanto, estaria Jens Schroeter, professor de teoria e a prática de sistemas multimídia na Universidade de Siegen. Em seu artigo “Discourses and Models of Intermediality” [Discursos e modelos de intermidialidade], Schroeter expõe quatro modalidades de discursos sobre intermidialidade: sintética, formal (ou transmidiática), transformacional e ontológica. Schröeter chega à conclusão de que em cada campo discursivo também o conceito de mídia é distinto, e que não se deve começar com definições de meios e então discutir intermidialidade, mas o oposto: O campo intermidiático produz definições para os meios. O que parece especialmente interessante em Schroeter é a clareza com que percebe que se trata de analisar a política de intermidialidade que está em vigor. Em O livro das ilusões, há uma sucessão de processos intermidiáticos: écfrase, análise fílmica, teoria do cinema, historiografia, intertextos – fictícios e realistas. O livro das ilusões é antes um pedaço de obra aberta, parte de uma escritura, que um livro, uma totalidade fechada em si mesma. Como nos aponta Benjamin, é no reino do extrassensível que encontraremos nossas respostas mais profundas. Comecemos com suas “iluminações profanas” acerca da natureza da semelhança: “As semelhanças percebidas conscientemente (...) são como a pequena ponta do iceberg”. Assim também viu Aby Warburg, que, depois de sua experiência com os índios do Novo México, passou a organizar seu inventário de imagens antigas dispondo-as como constelações, fazendo com que a distância e a proximidade entre elas nos contasse suas histórias. Creio que ao utilizar os conceitos de próximo e distante para investigar a intermidialidade no livro O Livro das Ilusões, de Paul Auster, nos beneficiamos tanto da teoria mais recente acerca das mídias e do diálogo entre elas, quanto de saberes filosóficos e historiográficos de Walter Benjamin e Aby Warburg, essenciais para a compreensão do conceito de constelação, de semelhança e das relações que se fazem entre o passado e o presente na transmissão de imagens e formas.