A ruptura revolucionária de 1789 e a primeira geração do Romantismo: o caso de F.-R. de Chateaubriand F.-R. de Chateaubriand viveu entre 1768 e 1848. Sua obra, em grande medida, trata das várias formas de rupturas experimentadas pela sociedade francesa após a Revolução de 1789. O tema da revolução perpassa seus romances e ensaios mas ganha configuração especial em suas memórias, intituladas Mémoires d’outre-tombe (Memórias de além-túmulo). Esse texto de caráter autobiográfico, redigido ao longo de quase quarenta anos, apresenta uma tentativa exitosa de articular diferentes instâncias enunciativas com o objetivo explícito de dar conta de uma posição inédita para o escritor, posição esta que vem a ser a de narrar uma história pessoal articulando-a com a narração da história de seu país. Neste caso, em se tratando de um texto de teor memorialístico, que se define fundamentalmente pela presença de uma dimensão importante da realidade histórica, o autor investe primeiramente e sobretudo na exploração de inúmeras formas de narrativa para expressar toda a complexidade desta realidade social composta pelos desdobramentos do processo revolucionários em seus vários níveis: político, social, cultural-religioso, linguístico. Nesse sentido, destacamos o aspecto híbrido do texto o qual aparece como um grande mosaico de formas que explicam, ilustram a realidade histórica; dentre essas formas que estruturam o texto, por exemplo, encontram-se diários do autor e retratos biográficos de figuras públicas. Mas nas Memórias do autor - autobiógrafo e memorialista - este cruzamento de perspectivas, que pode parecer constituir apenas um aspecto formal da sua escrita, traz em toda sua realidade artística as implicações da posição muito particular deste escritor: um nobre francês que sobrevive ao processo revolucionário e torna-se testemunha e historiador de si e dos eventos revolucionários na França. Ou seja, Chateaubriand narrou literariamente as experiências históricas por que passou a França pós-revolucionária, explorando esta dupla dimensão do pessoal e do social e mergulhando nas contradições dos atores da História bem como nas suas próprias contradições. Estas observações preliminares que dão as linhas de nossa abordagem devem orientar uma leitura mais clara a respeito da obra deste memorialista que trabalha em toda sua radicalidade uma enunciação da história num cruzamento com a literatura autobiográfica. Estudaremos assim a função do sujeito autobiográfico na construção de uma linguagem literária que deve expressar toda a tensão entre a ordem do antigo regime e as novas forças democráticas que ganham os palcos após 1789. Neste mesmo quadro, refletiremos mais amplamente sobre o empenho desta primeira geração romântica em dar forma a um processo de ruptura inédito que exige uma nova linguagem e uma reconfiguração de valores estéticos e políticos.
Palavras-chave: REVOLUÇÃO, FRANÇA, ROMANTISMO, NARRATIVA MEMORIALÍSTICA