Anais
RESUMO DE ARTIGO - XV ENCONTRO ABRALIC
PENSAR AS DEMANDAS: IMPLICAÇÕES ÉTICO-ESTÉTICAS DA ESPECTROLOGIA DE JACQUES DERRIDA NAS TEORIAS DA NARRATIVA
RAVEL GIORDANO DE LIMA FARIA PAZ
“Pensar o outro”: esse é o mote a partir do qual o historiador e cientista político Joanildo Burity desenvolve sua reflexão sobre, conforme o subtítulo do mesmo ensaio, "Derrida e a Teoria Social". Escrevendo sob influxo do livro Espectros de Marx, Burity rejeita a ideia de uma indiferença do pensamento derridiano pelas questões de cunho político-social, afirmando que, pelo contrário, Derrida e Marx partilham, quando menos, uma mesma injunção ética: a de se fazer justiça ao outro. Porém, a alteridade, que na dialética historicista de Marx ainda guarda as marcas dos determinismos positivistas, é concebida de modo muito diferente em Derrida. O outro, para Derrida, é, por um lado, uma individualidade sempre absolutamente irredutível a qualquer assimilação identitária, e, por outro lado, algo que habita, indissociavelmente, a própria “identidade” alheia. Menos ou mais que uma manifestação psíquica ou de qualquer espécie, o espectro é índice dessa configuração paradoxal da alteridade: sua incerteza e imprevisibilidade, mas também a força de suas demandas, não raro manifestas na forma de injunções inesquiváveis. Em seu delineamento do motivo do espectro, Derrida se vale de uma figura dramático-literária: o fantasma do pai de Hamlet. É do Hamlet de Shakespeare, também, que Derrida extrai um dos motes principais de seu texto: "The time is out of joint", sendo a própria duplicidade dessa disjunção (o desajuste social da realidade histórica e a não contemporaneidade a si do presente vivo) constitutiva do espectro. Entretanto, esse motivo também se presta a usos – ou, antes, a provocações – interessantes no âmbito das formas e teorias narrativas. Embora a instabilidade do espectro o impeça que ele constitua um ponto de vista, a figura do narrador guarda com ele muitas semelhanças para não ser pensada sob o seu prisma. Portador do que Derrida denomina um “efeito de viseira”, o espectro "vê sem ser visto", e nisso instaura uma espécie de dissimetria radical no mundo pretensamente objetivo. Ao mesmo tempo, o espectro é sempre mais de um: outros espectros, outras demandas, sempre o acompanham, inviabilizando qualquer pretensão sintetizante ou unitarista. Nesse sentido, a diegese narrativa pode ser vista como um complexo jogo de espectros, ou seja, de demandas cuja dupla condição – de indissociabilidade e, ao mesmo tempo, irredutibilidade umas às outras – exige aproximações críticas mais desenvoltas que, por exemplo, as possibilitadas pelos conceitos bakhtinianos de dialogismo e polifonia. Ao mesmo tempo, porém, coloca-se a questão dos limites de tais aproximações, sobretudo a de se saber qual o lugar, nelas, da instância autoral. A questão de se saber, em suma, se é possível dissociar os espectros ideológicos e subjetivos autorais das demandas em jogo nas diegeses narrativas; e se a resposta for negativa, a de como evitar os equívocos e reducionismos do biografismo. São essas questões, que pontuaram implicitamente diversos trabalhos nossos ao longo dos últimos anos, sobre escritores como Machado de Assis, Edgar Allan Poe, Thomas Bernhard e Kurt Vonnegut, que enfrentaremos diretamente nesta comunicação.
Palavras-chave: DERRIDA, ESPECTRO, NARRATIVIDADE
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