Anais
RESUMO DE ARTIGO - XV ENCONTRO ABRALIC
A POESIA E AS CIDADES EM SANTO AGOSTINHO
THIAGO GONÇALVES SOUZA, ROBERTO ACÍZELO QUELHA DE SOUZA
Tendo em vista o panorama das relações entre o pensamento filosófico e a atividade poética, baseadas em uma longa tradição de persistente controle disciplinar, ético e teórico, tal como nos apresenta, por exemplo, o filósofo Benedito Nunes (1999, 2010), a investigação proposta neste estudo se empenha em analisar, no interior do conjunto conceitual apresentado por Agostinho de Hipona (354-430), as estratégias de vigilância discursiva do âmbito filosófico e teológico sobre a linguagem poética. Para tal, procuraremos observar a articulação de três eixos distintos: o que sustenta a compreensão do santo Doutor acerca da natureza do conhecer e do papel da linguagem no processo do conhecimento e do ensino, assim como se nos é apresentada na obra De magistro, de 389; o que sustenta, de acordo com Agostinho, a dinâmica da ética cristã, guiada pelo conceito e pela experiência da caridade, que põe em relação os homens entre si e estes com Deus no sentido da compaixão e da fraternidade, como é exposto nas Confissões, a autobiografia escrita por volta de 397; e o da linguagem poética, praticada ou no teatro, no contexto da tragédia e da comédia, ou na ocasião dos festejos populares em honra dos deuses, ou mesmo no contexto litúrgico do hino: três situações de uso da palavra poética postas sob uma crítica severa, apresentada principalmente nas já citadas Confissões e em A cidade de Deus, publicada entre 413 e 426 – sendo que cumpre ressaltar ainda o fato de essa crítica encontrar amparo em obras como Contra os acadêmicos, diálogo datado de 386 (considerado a mais antiga obra de Agostinho), em que o autor nega, de modo veemente, a possibilidade de ascensão espiritual por meio da contemplação das belezas artísticas, o que havia sido assumido pelo neoplatonismo, uma das fontes do pensamento do Bispo de Hipona; ou ainda A doutrina cristã, cuja redação se inicia em 397, tendo sido concluída apenas em 426, na qual se propõe uma classificação para o conjunto das artes e dos saberes a partir de uma distinção de cunho moral, embasada em princípios teológicos, entre o que deve ser usado para alcançar um fim e o que deve ser fruído como fim em si mesmo. Nesse sentido, portanto, pretendemos expor uma compreensão da relação entre metafísica, epistemologia e poesia no contexto do pensamento agostiniano, buscando em seu interior os arranjos conceituais que se fizeram necessários para a crítica da palavra poética apresentada pelo padre latino e comunicada para a tradição posterior como reforço das estratégias de controle sobre a palavra poética: a suspeita diante da poesia como elemento poderoso de sedução e ilusão, capaz de conduzir os espíritos ao pecado, no que se afastem do sentido do ser de Deus e se contentem com o gozo das paixões mundanas.
Palavras-chave: SANTO AGOSTINHO, POESIA, CRÍTICA FILOSÓFICA DA PALAVRA POÉTICA
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