NATHALY FELIPE FERREIRA ALVES, MARIA ROSA DUARTE DE OLIVEIRA
Com proposições que se tornariam básicas para o estudo de poesia, T. S. Eliot, em 1917, aborda questões como o fazer poético, bem como a relação que se estabelece entre poesia e crítica (o que impulsionaria o redimensionamento do “poeta crítico”, figura já presente no romantismo alemão). A fim de explorar o vínculo entre os poetas e a tradição que lhes antecipa, o autor comenta que a presença do leitor (ou de um poeta-leitor) é imperativa para entender a relação entre os escritores do presente e do passado. Assim, o senso histórico será um dos pilares do que Eliot entende por tradição, uma vez que, por meio dele, é possível traçar meios comparativos entre autores inseridos na “eternidade do tempo literário”, sobre cujos monumentos debruçam-se os jovens poetas (seja para reavaliar o passado, numa atitude de compreensão, seja para vislumbrar o momento presente). Para Eliot, a busca pela singularidade (ou do “talento individual”) é um dos aspectos que particulariza um poeta que merece ser lido. Mas a diferenciação de um escritor contemporâneo depende da conexão que ele mantém com os poetas que o antecederam, porque é justamente essa associação que o torna singular. Aliado ao que Eliot entende por diferenciação, outro conceito emerge de suas ponderações crítico-poéticas: a totalidade. Ou, em outros termos, entender a literatura como uma tessitura dedicada, composta “por uma ordem geral”, abalizada pela simultaneidade. Tal “destino” literário, que encaminha a poesia contemporânea ao exercício de alteridade (deslocando-se de si, em um estado “crítico”), pode ser exercido a partir do diálogo intertextual deflagrado na materialidade dos poemas. Sobre essa questão, Leyla Perrone-Moisés pondera que é justamente através do corpo textual e, portanto, de sua forma, que imbricações entre a realidade “do mundo” e a realidade “possível”, criada poeticamente, “torna visível o real”. Dessa maneira, a palavra poética não presentifica a realidade, mas, paradoxalmente, ao expor a ausência das coisas, é capaz de promover uma mudança de perspectiva sobre como sentir o mundo: por entre as fendas do poema contemporâneo, instaura-se uma nova realidade (in)potência poética. Seja para deflagrar um espaço de realidade “insatisfatória”, seja para, implicitamente, cooperar com a sua transformação, a poesia contemporânea é reduto de resistência e nasce das fraturas de um tempo do que “já não é” e do que “ainda não foi”. Nasce, dessa maneira, em um espaço intervalar, alimentando-se das fissuras temporais insinuadas entre o seu tempo presente e o passado, inclusive, literário. Tendo como ponto de partida essas reflexões, nossa comunicação pretende problematizar as relações entre a tradição e a poesia contemporânea, a partir da leitura de “rapidalentamente”, flor indócil da expressão poética de Augusto de Campos, colhida do livro que nasce, à luz do signo da negatividade, Não Poemas (2003). Para tanto, é de nosso interesse observar de que maneira o “Paradoxo de Aquiles e a Tartaruga” se engendra às inquietações do poeta contemporâneo, a partir de sua leitura crítica da tradição.
Palavras-chave: AUGUSTO DE CAMPOS, NÃO POEMAS, POESIA CRÍTICA, CONTEMPORANEIDADE