Este trabalho pretende analisar o texto “A traição consequente ou a poesia de Cabral”, publicado no livro Lira e antilira (1968), de Luiz Costa Lima. Considerando-se a importância do pensamento desse estudioso para a crítica literária brasileira contemporânea, serão observadas as possíveis interferências que a sua teoria da mímesis possa ter exercido sobre essa leitura acerca da poesia de João Cabral de Melo Neto. Apesar do reconhecimento de que a escrita desse livro antecede a exposição da teoria da mímesis de Costa Lima, buscaremos apontar que algumas ideias expostas por esse crítico, como, por exemplo, a visualização do real por meio de lentes desfocadas e a ruptura de João Cabral com os poetas europeus que o influenciaram, carregam traços desse conceito que só vai ser explicitado muito posteriormente. A partir dessas aproximações, objetiva-se demonstrar que, mesmo de modo incipiente, a noção da mímesis como aquilo que instaura a diferença e não como o que reitera semelhanças já pode ser percebida nesse livro de 1968, embora o seu autor só venha explicitá-la no em Mímesis e modernidade, publicado em 1980. Em Lira e antilira, livro em que estuda a poesia de Mário de Andrade, Carlos Drummond de Andrade e João Cabral, além de uma breve passagem por Manuel Bandeira, Costa Lima faz um apanhado acerca da obra cabralina, desde o primeiro livro Pedra do Sono (1942) até Dois Parlamentos (1960), analisando-a em paralelo com a corrente filosófica da fenomenologia, de Edmund Husserl. Para Haroldo de Campo, Lira e antilira inicia uma nova fase na carreira de Costa Lima, pois “os estudos desse livro são precedidos de uma discussão da crítica estrutural e da proposta de uma crítica que se caracteriza pela “visada estruturalizante”, porém não destituída da “consideração histórica”. Ainda que haja divergência acerca da posição de que nesse livro Costa Lima já ponha em prática uma crítica estrutural, a fala de Campos chama a atenção para o fato de esse livro demonstrar o comprometimento intelectual desse crítico à medida que ele se propõe a analisa o texto literário amparando-se em uma teoria, o que indicaria o princípio da sua crítica da razão estética. Fugindo do amadorismo no exercício da crítica literária, Costa Lima apresenta métodos e teorias que começam a propor uma resposta para a difícil pergunta que lhe fizera o seu pai, quando da sua decisão de se dedicar ao estudo da literatura: “Como se estuda literatura?”. A essa questão Costa Lima tem se dedicado desde então, desenvolvendo estudos que aliem o teórico ao literário, como já demonstrara ao analisar a poesia de João Cabral, em Lira e antilira.
Palavras-chave: LUIZ COSTA LIMA, JOÃO CABRAL DE MELO NETO, MÍMESIS, CRÍTICA LITERÁRIA