FABIANNA SIMÃO BELLIZZI CARNEIRO, FLAVIO GARCÍA QUEIROZ DE MELO
“O Moirão escancarou os olhos espantado e benzeu-se outra vez. Não era ele dos mais supersticiosos, porém os modos estranhos do sertanejo naquela manhã despertavam em seu espírito as abusões da época” (ALENCAR, s/d, p.27). O excerto acima foi extraído da obra O sertanejo, de José de Alencar, publicada em 1875. Considerada uma das primeiras obras etnográficas da sociedade sertaneja, O sertanejo prima pelas descrições detalhadas do homem do sertão, evidenciando suas qualidades e seu bom caráter. E Alencar cria Arnaldo, personagem principal da obra em questão, homem que carrega a dureza da seca nordestina com honradez e braveza, sem deixar de acreditar que as superstições e crendices do local ou “abusões da época” poderiam salvá-lo. Aproximadamente meio século separa a produção de Alencar e Bernardo Élis. Nesse hiato, o campo brasileiro passa por profundas e decisivas mudanças, tanto na esfera social quanto em outras instâncias: política, econômica e geográfica. Todavia, ainda persistem as superstições, os agouros e encantos (evidenciados nas narrativas de Bernardo Élis) advindos de um espaço que até mesmo pela sua localização proporciona a crença em mistérios e salvações divinas: o sertão do Brasil. Considerado por Gilberto de Mendonça Teles (2007) “o Edgar Allan Poe do sertão”, Élis imprime às suas obras uma tessitura temática que se aproxima das narrativas góticas inglesas, com características que perfilaram em várias produções de escritores brasileiros considerados regionalistas. Portanto é este sertão onde perduram tradições e costumes antigos, argutamente trabalhado e evidenciado na escrita bernardiana, que nos interessa. No conto “Pai Norato”, por exemplo, Bernardo Élis entra com profundidade no tema abusões, mostrando que o sertão, ao contrário do purismo dicotômico sertão versus cidade, guarda mistérios que podem fornecer uma amostra do que seria a categoria sertanejo: “[...] personagem principal de uma narrativa mítica sobre a conquista da civilização pela nação brasileira” (SUÁREZ, 1988, p.30). Explorar o espaço do sertão e trazer à tona seus feitiços, encantos e mistérios, equivale a desvendar um locus que não se restringe ao viés maniqueísta daquilo que não seria o litoral, ou do estudo limitado que insere o sertão dentro dos limites de vegetação e clima. Veremos, portanto, que o espaço sertanejo - ao contrário da ausência de civilização ou da cultura rústica e grosseira, muito tem a dizer a respeito da própria história de nosso país. Trata-se de um trabalho não conclusivo, cuja metodologia se pauta em pesquisa bibliográfica que será devidamente referenciada ao longo do texto. Este trabalho está vinculado à Tese: “Um ser tão assombrado: as manifestações do gótico no Regionalismo brasileiro do Romantismo ao Modernismo”, do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Letras da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Palavras-chave: REGIONALISMO, LITERATURA BRASILEIRA, LITERATURA FANTÁSTICA, SERTÃO