Os mundos possíveis do insólito ficcional são mundos construídos a partir de uma ruptura na base da composição de mundos e submundos narrativos, em que há a irrupção do inusitado em quaisquer das categorias narrativas, quer seja tempo, espaço, ação ou personagem. Nesses mundos possíveis ficcionais, as personagens se compõem de submundos articulados a mundos, que submetidos a um eixo central, mundo articulatório, desenvolvem-se por meio de traços profundamente conectados com a realidade dos seres de carne e osso, ocasionando, portanto, uma identificação entre o mundo possível da ficção e o mundo possível referencial de base. Nesse cenário em que o insólito se manifesta, a composição da personagem, com traços de ambiguidade e dúvida em seus diálogos, em geral, pode desencadear gradativos questionamentos capazes de pôr em xeque as estruturas compositivas dos mundos que habitam. No âmbito dos mundos possíveis ficcionais, o insólito manifesta-se e pode romper algum traço de uma ou mais categorias narrativas ali construída, instaurando uma ordem corrompida ao formatar uma gradativa transformação do mundo textual configurado. Isso por permitir que a dúvida e o questionamento tornem-se o centro da estruturação narrativa. Em “Aglaia”, de Murilo Rubião, exemplo de construção desses mundos possíveis do insólito ficcional, a fenomenologia do insólito é denunciada a partir do incômodo, da privação das vontades. No mundo possível ficcional rubiano, as personagens são obrigadas a aceitar a decorrência de acontecimentos surpreendentes e, poder-se-ia dizer, fora de controle. A construção de uma crescente desilusão, vinculada à perda de referências, inicialmente estabelecidas, leva à ruptura de acordos firmados pelas personagens. Aglaia, que dá nome ao conto, é ser de ficção com existência ressignificada pela amargura crescente e pela incapacidade de controlar os eventos incomuns que invadem seu quotidiano. Os traços de caracterização, que configuram a personagem, são tramados para gerar dúvida, incerteza, com a confecção de um tipo pouco a pouco desconstruído psicologicamente e fisicamente após as sucessivas irrupções do insólito. No mundo possível ficcional, a vida de duas personagens ali focalizada acaba por denunciar motivações muito próprias dos discursos fantásticos, em que personagens utilizam-se de dados científicos para comprovar a irrupção do insólito. Para além disso, diante dessa configuração, os seres ficcionais em Rubião são marcados por sombras existenciais muito próprias, maculadas por uma dor decorrente do próprio existir. Assim, o estar no mundo gera um gradativo desagrado e mal-estar. Pretende-se demonstrar, na presente reflexão, os múltiplos tons assombreados da composição dessas personagens que, pouco a pouco, vão configurando-se pela descoberta de um novo indesejado, sem respostas esclarecedoras, mas profundamente desafiador, principalmente pela ruptura estruturada de extrapolação de limites ficcionais estabelecidos. A procura pelos modelos de construção de mundos, tomando como eixo central a figuração das personagens, terá como foco o olhar das personagens sobre si mesmas e também as estruturas perpendiculares que desafiam os submundos de personagens, obrigando-as a pôr em xeque o próprio conhecimento acerca do mundo que as cerca.