Anais
RESUMO DE ARTIGO - XV ENCONTRO ABRALIC
UM PASSEIO NA LOJA DE SOUVENIRS: MARIA ANTONIETA, OSCAR WILDE E AS NARRATIVAS DO CORPO AUTOFICCIONAL
LUIZ GUARACY GASPARELLI JUNIOR
A rainha da França, Maria Antonieta (1755-1793) e o escritor irlandês Oscar Wilde (1854-1900) sempre fizeram de seus corpos objeto de uso político, tanto ela na corte de Versailles, como ele na Era Vitoriana, e produziram narrativas performáticas, em suas tentativas de criar uma possível autenticidade nas formas de ser, de se apresentar perante a sociedade e de se (re)configurar enquanto figuras de transição histórica. Nosso trabalho propõe refletir sobre o fazer biografemático, conforme os conceitos elaborados por Roland Barthes, no livro “A Câmara Clara”, e os estudos sobre performance e gênero, como meios de se pensar as perspectivas sobre o corpo, a identidade, a construção de uma possível autenticidade de si como narrativa e a obra de arte, todos em confluência. Maria Antonieta e Wilde autoficcionalizavam-se e eram, ambos, performers de si mesmos avant la lettre. Produtores de uma vida artificializada pela soberania da corte ou da arte, extrapolaram os limites culturais e estéticos; refletiam o biografema do corpo, que tem voz e nunca se cala, nem após a morte física trágica. As noções de gênero e biografia, para a rainha e o escritor, se unem à noção de performance, e, assim como a atuação midiática e a mitologia que os cercam, seguem por caminhos próprios: fazendo do corpo uma voz que ecoa muito mais do que suas palavras e ações. Tanto ela quanto ele constituíram-se muito além de suas obrigações de direito e profissionais; não foram apenas a rainha ou e escritor que marcaram, na História, suas existências. Mas as diversas formas de performatizar o corpo é que possibilitaram a ambos se tornarem mitos no universo camp. Maria Antonieta, rainha cujo epíteto é “Rainha da Moda”, construiu em suas narrativas pessoais, correspondências, diários e memórias a imagem de frívola, coquete, mas evoluiu, no final da vida, à imagem de mártir e abnegada, para morrer em nome de seus ideais monarquistas. Oscar Wilde, o “autor esteta”, fez um caminho similar: ludibriou os rigorosos sistemas sociais ingleses do final do século XIX e produziu, enquanto escritor, obras do calibre de “O Retrato de Dorian Gray” e viveu, enquanto figura pública, as peripécias apregoadas em suas escrituras. Sorveu do hedonismo seu máximo e, no fim, definhou até o mais pútrido estado físico; personificou, enfim, sua própria narrativa decadentista. Para além da existência de ambos, enquanto seres biológicos, temos, hoje, a possibilidade de lidarmos com uma mitologia camp dessas duas personalidades históricas. Seja no cinema, música, literatura, e até mesmo em lojas de souvenirs, a rainha e o escritor conseguiram ultrapassar os limites da existência física e se imortalizaram numa convergência de paródias de si mesmos. E nenhum outro contexto possibilitaria tamanha potencialidade dos atributos de nossos personagens: o pós-modernismo; que é, para o camp, ao mesmo tempo o berço e o templo de culto de pessoas que transitam entre mundos, narrativas e histórias de si mesmos. Propomos, assim, análises dos modos de ser, viver e expressar de Maria Antonieta e Oscar Wilde, personagens autoficcionais que hoje circulam em nossa sociedade, ao estabelecerem novos limites para os modos de pensar e agir a respeito de gênero, corpo, história, poder e política, incorporando à marginalidade de suas atitudes em suas devidas épocas, o charme nada discreto do camp.
Palavras-chave: AUTOFICÇÃO, CAMP, PERFORMANCE
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