No poema Estudos para uma bailadora andaluza, João Cabral de Melo Neto propõe imagens potentes para a constituição lírica da bailadora, que corporifica, em seus movimentos, a tragicidade e o erotismo da tradição na dança flamenca. O poema é dividido em seis partes que se associam aos movimentos da bailadora na execução de siguiriyas, dança popular espanhola (desde o século XVIII), pertencente ao Canto Jondo, característico da cultura flamenca. O formato do poema, em seis partes/cantos pode ser visto como os compassos ou palos flamencos que variam conforme a temática, a escala e a progressão dos acordes desse estilo musical. Como referência ao processo coreográfico, o poema segmenta-se a partir das etapas do espetáculo encenado pela bailadora: o incendiar-se; o transfigurar-se em um misto de animal e mulher; o representar-se na composição de uma linguagem codificada; o enraizar-se em suas tradições; o definir-se em uma estátua; o desfolhar-se em sedução. É sobre cada um desses processos que se constitui a análise aqui proposta. Este artigo visa a apresentar uma leitura sobre o poema Estudos para uma bailadora andaluza, de João Cabral Melo Neto. Para isso, propõe-se uma abordagem a partir das imagens da bailadora, no poema, associadas à representação de gestos dançados no processo coreográfico característico dos bailados flamencos. Ao longo da abordagem, reflexões estéticas e filosóficas, especialmente de Georges Didi-Huberman e de José Gil, serão tomadas como referência para o raciocínio desenvolvido. É também propósito desta análise fazer conexões entre literatura e dança, visando a percorrer os territórios interartes como exercício teórico e analítico do Comparativismo.