Este estudo possui em seu esteio a literatura comparada. O ponto de convergência a ser analisado é o processo de representação cultural do sertão no romance Cascalho de Herberto Sales e o filme Cascalho de Tuna Espinheira (2005). Além disso, evidenciar-se-á também o desenvolvimento e a transformação dos discursos acerca do sertão como categoria problemática, no geral, como identidade viável ou vir-a-ser, em particular.O sertão – o espaço do outro – local que povoa o imaginário nacional e sempre revisitado por autores, tanto na literatura como também no cinema. O sertão representado nas obras supracitadas – em uma das leituras possíveis – desliza sobre os arquétipos da cultura sertaneja e provocam uma possível transformação. Esta transformação nos discursos seria baseada numa modificação no plano sócio histórico, daí que a abordagem estabeleça, partindo dos dispositivos de Herberto Sales e de Tuna Espinheira, o esboço de uma cartografia sertaneja baiana - que iria do mito fundacional à utopia da modernização. O estudo identificará uma consonância do plano literário e cinematográfico com o social, sem, é claro, considerar a literatura ou o cinema meramente como reflexos da sociedade e da situação histórica. O ponto de contato se daria no aspecto em que o discurso acerca da sertanidade e dos discursos representativos mostram graus de elaboração consonantes com as transformações e performances dentro desse campo. Logo, o objeto de exame deste texto, portanto, são os significados desse discurso. O propósito central é demarcar e problematizar as representações de sertão, enquanto cartografia e paisagem social, nos discursos de Herberto Sales e Tuna Espinheira. A partir do diálogo que os autores estabelecem com os textos operatórios do sertão pré-construído, atentando para as ênfases e omissões, reiterações e deslocamentos que ali são postos, como também para as formas como ele recorta, localiza, aprisiona, classifica, hierarquiza, define, enquadra e exclui/inclui o sertão na história. Assim, o estudo aqui proposto busca flagrar os mitos e estereótipos, estigmas e imagens que vão emergindo na configuração, tencionando perceber que filiações políticas elas insinuam, os mecanismos de poder que se apresentam, que projetos são ali anunciados. Essas artimanhas, ou técnicas narrativas, se aproximariam numa espécie de codificação que permite ao narrador expor sobre as cartografias sertanejas em índices comuns: a narrativa focada na memória, possuindo como ponto de observação a experiência interior; a experimentação linguística, em graus variados, de acordo com o objetivo de cada narrador e tipo de texto; a ideia latente de testemunho ou de relato, no sentido de que os narradores se propõem a fixar, através do texto, uma subjetividade que retoma ao narrador clássico benjaminiano.
Palavras-chave: HERBERTO SALES, LITERATURA COMPARADA, SERTÃO, CINEMA