A presente comunicação pretende analisar poemas da antologia Alta noite em alta fraga de Joaquim Manuel Magalhães, publicada em 2001. O poeta, reconhecido por reescrever seus poemas no livro Um toldo vermelho de 2010, modificando e alterando palavras e versos inteiros, em Alta noite em Alta fraga demonstra mais do que a predileção pela rasura, mas também pela elegia. O caráter elegíaco, presente na Literatura Portuguesa Contemporânea aqui é investigado pelo seu viés urbano. Em imagens e descrições corpóreas, o sujeito poético, presente na antologia de 2001, explora a cidade como um observador atento, preocupado com os elementos poéticos que o associam com a paisagem. O corpo, doente e experimentado pela realidade fictícia do poema, não só reflete a condição da sociedade em que está inserido como também a própria linguagem. O pathos está vinculado à linguagem distópica, criando o espaço para o elegíaco. Mas, o estudo não estaria completo sem o outro lado da estética do poeta. Um toldo vermelho é um livro constituído pela reescrita de poemas antes publicados por Joaquim Manuel Magalhães ao longo de três décadas. Dentre os livros compilados está Alta noite em alta fraga, entre outras publicações, nas quais os poemas reaparecem reeditados com alterações e supressões. Por isso, Um toldo vermelho desautoriza as versões anteriores, mas também contempla todas, ou apenas aquelas que sobreviveram ao violento processo de reescrita. Ao contrário da reedição promovida pelo autor em outras coletâneas, o processo adotado para a construção de Um toldo vermelho pode ser considerado radical, visto que intenciona apagar o registro anterior. O processo de reescrita exclui e substitui o texto antecedente, um discurso conciso, politicamente inflamado e de caráter elegíaco. Na análise de alguns poemas de Alta noite em alta fraga, poderíamos encontrar passagens que o conectassem com as categorias específicas da tradição literária romântica, tais quais o eu-confessional, a melancolia, o desencanto sobre a paisagem urbana e até mesmo a temática amorosa. Mas, ao ler adequadamente os poemas, percebe-se que a apropriação destes elementos é uma apropriação em crise. Crise no sentido de tensão entre uma tradição anterior e a contemporaneidade. Se o sujeito poético aparece em primeira pessoa, a motivação não está em projetar a partir dele o mundo, mas sim em ironizar o mundo através do seu olhar. O poeta torna-se aquele que pode dizer a imagem urbana e retirar dela o sentido para escrever. Com isso, intenciona-se analisar alguns poemas escolhidos e suas respectivas reescrita em Um toldo vermelho para, a partir deste corpus, pensar a poesia elegíaca como característica poética que persiste neste projeto poético. A questão do corpóreo e da linguagem estão diretamente envolvidas com a paisagem construída no poema e relacionadas com a imagem da perda. Se, de acordo com Ruy Lage, a elegia liga-se a um modo especializado de olhar o mundo: a contemplação (LAGE, 2010, p. 166), cabe refletir sobre a forma deste olhar ser descrito pelo sentimento de distopia presente em Alta noite em alta fraga e a sua reescrita em Um toldo vermelho.