A presente comunicação se enquadra nas atividades do grupo de pesquisa ETTE (Estudos e Traduções do Teatro Espanhol) e refletirá sobre a experiência no processo tradutório da obra El retrato vivo, de Agustín Moreto, traduzida ao português por Danielle Olivieri (UFRJ) e Rafaela Ferreira (UFRJ), que se publicará brevemente no site moretianos.com do grupo de pesquisa PROTEO, da Universidade de Burgos, e no livro Teatro Breve do Século de Oro (em preparação pelo grupo ETTE). Moreto, considerado um dos principais dramaturgos do chamado “ciclo de Calderón de la Barca” (Ruiz Ramón, 2000), se destaca em obras de gênero cômico, como a comédia urbana e o entremez, gênero no qual se insere El retrato vivo. Nosso objeto de estudo levará em conta características formais e tipológicas do teatro barroco espanhol, cujo traço mais marcante se centra na composição polimétrica e no diálogo em verso. A posição do tradutor deve assumir a singularidade estética de ditas obras e elaborar estratégias que evitem um excessivo servilismo à clarificação do sentido e a uma série de tendências deformadoras do original correlacionadas, como alongamentos, empobrecimentos qualitativos, etc. (Berman, 2007). A tendência à clarificação pode carregar um efeito negativo, na medida em que o tradutor modifica o jogo propositalmente polissêmico do original numa simplificação, acarretando um sentido monossêmico, isto é, define/explicita algo que originalmente está indefinido/obscuro. Acreditamos que, neste tipo de peça, o sentido é um efeito da forma e a operação mais delicada para traduzir os efeitos de sentido do texto original consiste em resgatar efeitos rítmicos e sonoros, sem os quais as características da peça barroca se perderiam. Dessa forma, buscou-se um equilíbrio entre a tendência etnocêntrica, inconscientemente inerente às traduções, mas criticada por Berman (2007), com uma tendência compensadora que mantenha, ou tente pelo menos, os valores formais da rima sem sacrificar a equivalência de sentido. Ademais, vale ressaltar que a tradução da obra em análise não foi pensada para encenação, mas para edição. Tal escolha, segundo Zamorano e Couto (2015), leva-nos a considerar duas dimensões – superfície e tempo –, diferentemente do que ocorre em uma tradução voltada para encenação, em que o tradutor deve considerar três dimensões – superfície, tempo e espaço. Isso não impede que a peça seja posteriormente objeto de encenação, senão que seu primário modo de circulação é o meio impresso e a leitura neste meio a base para possíveis transformações. Considerando tais fatores, a tradução de obras do teatro breve do Século de Ouro também obriga a relacionar dois momentos idiomáticos num processo tradutório: a realização de uma tradução intralinguística (Jakobson, 1970) – do espanhol do século XVII para o espanhol atual, mediante perífrases aproximativas – e a posterior tradução da língua de origem para a língua de chegada – do espanhol atual para o português atual. Portanto, através da tradução da obra El retrato vivo, pretendemos mostrar que o processo tradutório do teatro breve espanhol do Século de Ouro transcende o plano puramente linguístico, pois se relaciona diretamente ao plano textual, numa dimensão pragmática que envolve perspectivas temporais e mudanças culturais.
Palavras-chave: TRADUÇÃO COMENTADA, TEATRO DO SÉCULO DE OURO, ESTRATÉGIAS DE TRADUÇÃO