A década de 1960 marca o início de experimentações poéticas de Murilo Mendes (1901-1975) no universo da prosa. A escolha do poeta brasileiro, radicado na Itália a partir dos anos 1950 como professor de cultura e literatura brasileira a serviço do Itamaraty, pela narrativa – num momento em que a faculdade de intercambiar experiências estaria em vias de extinção, conforme Walter Benjamin, e em que a morte dos vaga-lumes seria decretada por Pasolini, como lembra Didi-Huberman – suscita reflexões acerca do gesto político da escrita tardia em prosa de um poeta desterritorializado que escolheu a Europa como lugar para morrer. Motivadas por viagens e mediadas por leituras, memórias, lugares afetivos, experiências, convivência com artistas, músicos, poetas e homens de letras, as escritas de Carta Geográfica (1965-1967), Espaço Espanhol (1966-1969) e Janelas Verdes (1970), editadas e publicadas em livros postumamente, remetem a deslocamentos, a pátrias eletivas, ao gesto de colecionar e ao rompimento da noção de gênero. Busca-se, pois, uma leitura desses livros para se pensar também no transbordamento do diário de viagem, na situação de trânsito do intelectual latino-americano, no lugar ocupado pelo escritor na República das Letras e no traço de contemporaneidade de sua literatura.
Palavras-chave: DIÁRIO DE VIAGEM, POLÍTICA DA ESCRITA, REPÚBLICA DAS LETRAS, MURILO MENDES