Anais
RESUMO DE ARTIGO - XV ENCONTRO ABRALIC
MURILO MENDES DIANTE DO QUADRO
LUISA DE AGUIAR DESTRI
A comunicação propõe a análise de “Il quadro”, de Murilo Mendes, poema pertencente a Ipotesi (livro escrito em italiano e publicado postumamente, em 1977) e que coloca o eu lírico diante da obra O Casal Arnolfini (1434), do flamengo Jan Van Eyck. O objetivo é mostrar como nessa composição os traços característicos da produção tardia do poeta se relacionam com uma perspectiva histórico-social mais consequente – a qual, postula-se, seria fruto de uma nova relação que o autor passa a manter com a cultura após a mudança para a Itália, em 1957. Embora se trate de um exemplo do que James Heffernan (Museum of words: the poetics of ekphrasis from Homer to Ashbery. Chicago: University of Chicago Press, 1993) identifica como a écfrase tipicamente moderna (centrada em uma obra de arte em particular e incorporando ao texto o contexto do museu), e apesar de muitos poemas murilianos se ocuparem da descrição de pinturas, “Il quadro” representa um caso singular na trajetória do autor. Isto não apenas em termos de procedimentos, já que a construção literária como a alegoria benjaminiana é característica dos poemas que Murilo Mendes escreveu após o fim da Segunda Guerra Mundial, mas sobretudo pelo seu teor reflexivo. Essa perspectiva, entendida como resultado de uma maior consciência histórica, se manifesta de modos diversos, e em todos os âmbitos da produção muriliana, o que a comunicação pretende também demonstrar. Para tanto, o poema é comparado a outros textos, em que igualmente se realizam descrições de obras visuais ou em que surgem temáticas semelhantes (como a amorosa). A comparação será realizada principalmente com textos de inspiração surrealista (como o poema “Harpa-sofá”, de Mundo enigma, composto a partir da obra Sofá harpa, de Maria Helena Vieira da Silva), o que permitirá identificar a relação que Murilo Mendes estabeleceu com a cultura e pontuar como se modificaram, ao longo da trajetória poética, as relações entre sujeito e objeto, entre literatura e realidade. Essa estratégia permite postular que, na trajetória de Murilo Mendes, uma maior capacidade de questionamento da arte foi acompanhada pelo distanciamento da estética surrealista – o que se confirma inicialmente nos poemas de Sonetos brancos (1946-1948) e tem sua primeira manifestação europeia em Siciliana (1954-1955). Esta é a hipótese que venho desenvolvendo em minha tese de doutorado, e que as diferenças entre “Il quadro” e outros poemas ecfrásticos do autor, consideradas num contexto de relação com a cultura europeia, ajudam a iluminar. A comunicação pretende, em suma, entender a singularidade de “Il quadro” a partir da relação entre poesia e história e em correlação com a experiência italiana do poeta.
Palavras-chave: MURILO MENDES, IPOTESI, POESIA BRASILEIRA, POESIA E HISTÓRIA
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