O escritor e cineasta italiano Pier Paolo Pasolini veio ao Brasil em 1970, quando passou pelo Rio de Janeiro e por Salvador durante alguns dias de suas férias. A visita, embora de curta duração, pôde proporcionar ao autor uma vivência profícua: foi possível ver, nas cidades brasileiras, os sinais vivos das contradições existentes em nosso país. Dessa experiência, surgiram alguns poemas, dentre os quais se destaca “Hierarquia”, publicado no livro Trasumanar e organizzar (1971). Nele, há um relato do Rio de Janeiro como “uma cidade desesperada onde europeus pobres / vieram recriar um mundo à imagem e semelhança do deles”. Esse contato direto com um país subdesenvolvido ocorreu concomitantemente ao período em que o intelectual passou a escrever com obstinação análises políticas e sociais sobre a sociedade italiana, sobretudo por meio de textos publicados em jornais de grande circulação. Pasolini se mostrou interessado em observar e compreender de que maneira uma nova ordem, pautada por um certo modo de vida burguês e pelo consumismo, reverberava consequências sociais, políticas e culturais na Itália após os avanços econômicos possibilitados pela Revolução Tecnológica. Entretanto, apesar das distâncias geográficas e históricas existentes entre Brasil e Itália, o escritor observava algo em comum ao desenvolvimento de países tão diferentes, o que o leva a afirmar que: “Eu vivi uma experiência histórica muito original, extremamente retardada, por um lado, mas também extremamente antecipada, por outro, porque é a experiência que viverão os países do Terceiro Mundo daqui a alguns anos”. Há algo de muito particular que Pasolini reconhece na Itália dos anos de 1970, que é também, em certo aspecto, algo que ele também vê em países do Terceiro Mundo, como é o caso do Brasil. Nesse sentido, o principal interesse dessa comunicação é investigar, a partir de poemas e textos jornalísticos, de que maneira o autor percebe intersecções entre os dois países. Mais do que mapear as semelhanças e as diferenças entre ambos, a intenção é analisar como as percepções e os registros discursivos produzidos por Pasolini identificam na Itália e nos países do Terceiro Mundo uma relação entre os rumos econômicos e as manifestações sociais e culturais: “Ó Brasil, minha terra natal, onde / as velhas lutas – bem ou mal, já vencidas – / para nós, velhos, voltam a fazer sentido”. Pretende-se então aprofundar a compreensão das impressões sobre o Brasil enquanto uma rememoração do que ocorria na Itália ou, antes, perceber na realidade italiana uma anunciação do que viria a ocorrer no Brasil.
Palavras-chave: PASOLINI, LITERATURA ITALIANA, VIAGEM, EXPERIÊNCIA