As investigações sobre a complexa relação entre literatura e testemunho têm se consolidado gradativamente no Brasil nas últimas décadas. Grupos de pesquisa, dossiês temáticos, publicações de livros, eventos e teses confirmam o interesse que o assunto vem despertando atualmente. Os trabalhos destacam, por exemplo, a necessidade/obsessão do sobrevivente de grandes catástrofes históricas, ou da vítima de violências institucionais, em preservar a memória do sofrimento, denunciando o horror vivido para evitar que ele se repita - istoé, aceitando o compromisso ético de "manter o passado atino no presente" (Seligmann-Silva, 2013, p.48). Partindo dessas contribuições, nossa proposta reivindica uma presença maior da poesia lírica nos debates sobre o testemunho. Se fora do Brasil a poesia frequentemente foi levada em conta, como mostra a inequívoca presença, por exemplo, de Paul Celan em um implícito "cânone do testemunho", em nosso país a ênfase dos estudos recaiu quase que exclusivamente na prosa. Assim, partimos da perspectiva já consagrada por autores como Alfredo Bosi (2000) e Adorno (2006) de que a poesia apresenta forte componente social e, em vez de ser exclusivamente zona de escape para emoções subjetivas, é também capaz de ponderar sobre dilemas históricos e, consequentemente, sua estrutura não é imune ou hostiu à escrita do testemunho.