Em The Play About the Baby (1998), de Edward Albee, um jovem casal tem seu bebê roubado por dois enigmáticos sujeitos, Woman e Man. Ao longo da ação, ambos dirigem-se para a plateia, comentando aspectos relativos a episódios que tanto meramente testemunham, quanto, gradualmente, passam a organizar e controlar. Ademais, discutem e analisam suas representações e funções no interior da lógica do espetáculo. A estratégia parece evocar a proposição de Lionel Abel (1963) para o “metateatro” como uma experiência em que personagens encontram-se cientes de sua natureza dramática e, portanto, moldam e norteiam a dramatização dos eventos desenrolados no palco de acordo com seus desejos e ímpetos fantasiosos. A temática de um casal que perde seu filho retoma o trabalho mais icônico do dramaturgo, Who’s Afraid of Virginia Woolf? (1962), no qual George conduz uma série de ações ritualísticas para que um garoto ficcional que possuía com Martha termine verbalmente negado, e, consequentemente, morto. O sacrifício ergue-se sobre citações e empréstimos literários, como referências ao teatro de Tennessee Williams e a trechos da liturgia católica, e sobre o esforço pessoal de narração criativa, por meio de um telegrama fúnebre inventado. Em tal âmbito, o assassinato idealizado pela personagem visa à explicitação da teatralidade de seu matrimônio com Martha, e, em via oposta aos heróis das análises de Abel, utiliza-se da manipulação da ficcionalidade não para construções do ilusório, mas para o seu solapamento. São recorrentes no teatro albeeano situações de quebra da quarta parede stanislavskiana, que parecem atender primeiramente à função de expor não apenas o caráter ficcional da própria encenação e do ofício teatral, mas as tantas fantasias consoladoras nas rotinas dos sujeitos contidos no espetáculo. Para o dramaturgo, a incapacidade de reconhecer a artificialidade não poderia ser mais nociva, cabendo, assim, a determinadas personagens a (re)dramatização deliberada, para que vislumbres obrigatórios de realidade sejam produzidos. Pretende-se, pois, discutir a configuração da metateatralidade na obra de Albee pela análise de The Play About the Baby e Who’s Afraid of Virginia Woolf?. Entendemos que a peça de 1998 simultaneamente comenta si própria e o título de 1962. Este, por sua vez, apresenta um sacrifício envolto em teatralizações conscientes. Indagar sobre tais autorreferencialidades é, por conseguinte, refletir sobre o diálogo que o autor estabelece com a herança dramática norte-americana da Broadway, especialmente por meio de Eugene O’Neill, criador de indivíduos enredados no autoengano e em ficções que não devem ser depostas. O teatro que se espelha e se estuda de Albee talvez responda, enfim, à pergunta feita pelo garoto ao Man, se ele e Woman vieram para ferir. Referências básicas: ABEL, Lionel. Tragedy and Metatheatre: Essays on Dramatic Form. Ed. Martin Puchner. New York and London: Holmes & Meier, 2003. ALBEE, Edward. The Collected Plays of Edward Albee: 1958 – 1965. New York: Overlook Duckworth, 2007. _____________ The Collected Plays of Edward Albee: 1978 – 2003. New York: Overlook Duckworth, 2008. BIGSBY, C. S. W. Modern American Drama – 1945 - 2000. Cambridge University Press, 2000.
Palavras-chave: METATEATRO, TEATRO NORTE-AMERICANO, EDWARD ALBEE