Na obra Kosmofonia Mbya Guarani (2006), o poeta Douglas Diegues traduz para o português, juntamente com os indígenas da comunidade Mbya, os cantos dessa etnia, a partir da coleta e edição desse material, realizada pelo etnomusicólogo paraguaio Guillermo Sequera. Sua participação nesse trabalho é relevante tanto como tradutor, quanto como organizador e autor de vários textos que procuram refletir sobre a poética do povo Mbya. Partindo do pressuposto que a tradução é criação e equívoco inevitável, é preciso considerar como a obra em questão articula culturas incomensuravelmente diferentes, a letrada e a oral, a do homem branco e a do indígena sul-americano, articulação que é parte da obra poética de Diegues como um todo. Desse modo, ao tomar essa produção nesse contexto, no qual a tradução é ferramenta fundamental, em sentido amplo, procuramos esmiuçar o quanto o contato com o repertório das textualidades indígenas torna-se um lugar de reflexão crítica e estética a partir do qual Diegues compõe seu projeto artístico. Nesse sentido, levando em conta as contradições inerentes ao processo de produção e recepção da obra Kosmofonia Mbya Guarani, discutimos também seu potencial crítico e renovador no que se refere à proposta de uma noção extraocidental de literatura e de poesia.
Palavras-chave: Cantos indígenas – Douglas Diegues – Poesia brasileira