Nosso objetivo ao fazer a leitura do conto O profundo silêncio das manhãs de domingo (2006) de Luiz Ruffato é o de pensar a morte/suicídio como aspecto incontornável da experiência humana, condição que a/o torna tão permeável ao discurso literário e filosófico. Por esta razão, acreditamos ser lícito pensar os embricamentos múltiplos que se estabelecem entre literatura e filosofia no texto ruffatiano, principalmente em virtude da extrema argúcia narrativa do escritor mineiro e de sua capacidade de agenciar profundos questionamentos sobre a condição humana. Nesse sentido, procuramos compreender os modos pelos quais ruffato problematiza a experiência da perda e da morte através da vivência cotidiana de personagens ordinárias, cujos sentimentos e emoções são expressos num discurso esteticamente elaborado e conectado a seus estados anímicos. Mais do que isso, pretendemos considerar os sentidos que se formam tanto na consciência das personagens literárias quanto na própria consciência do leitor sobre a finitude corpórea, já que entendemos ser característico dos discursos filosófico e literário a busca de uma compreensão mais acurada das relações que o homem estabelece com o mundo e consigo mesmo. Diante deste objetivo, propomos ler o conto supracitado procurando entender as ressonâncias do suicídio na psiquê das personagens, que se revolvem sobre a conflituosa dinâmica vida/morte, e perceber os significados desse ato para a compreensão da realidade. Em concordância com esta tentativa sempre problemática de entendimento do real encenada no conto, pretendemos ainda coadunar a perspectiva filosófica que se detém sobre a relação do homem com seu próprio perecimento, especialmente quando este é autoinfligido. Por isso, procuramos no pensamento de Vladimir Jankelevitch (2004), Emil Cioran (1969), André Comte-Sponville (2002), Zygmunt Bauman (2009) e Albert Camus (1989) as bases de um raciocínio mais esclarecido sobre o suicídio e sobre seu sentido para a experiência humana no mundo. É importante salientar que o cotejo destes vários pontos de vista contribui para se pensar os modos pelos quais a narrativa ruffatiana erige um espaço de questionamento dos sentidos mais cristalizados sobre o suicídio, ao mesmo tempo em que propele a discussão dos modos pelos quais lidamos com a experiência do fenecimento. Assim, mantendo-nos sempre próximos ao texto perceberemos que a inter-relação profícua que se estabelece entre a obra de ficção e as questões filosóficas permite o perscrutamento de uma dimensão mais profunda da realidade humana, como está apontada no próprio título do conto, dando vazão a uma série de inquirições que nos levam a reconsiderar o nosso relacionamento com a exterioridade de nossos corpos bem como com a interioridade, ação esta que tão bem é representada pela atividade filosófica e literária.