O crítico e teórico Luiz Costa Lima, em “Sebastião Uchoa Leite em prosa e verso” (2002), reconhece o poeta, tradutor e ensaísta Sebastião Uchoa Leite (1935-2003) como um dos representantes de uma estirpe bastante rara entre nós: a dos poetas-críticos. “Como ele, haviam sido apenas o Machado do ‘Instinto de Nacionalidade’ e do ‘Eça de Queirós’, o Cabral de Joan Miró, Mário Faustino e Haroldo de Campos” (2002, p. 215), escreveu Lima. Leite cultivou uma vigorosa e densa prosa crítica em paralelo ao seu trabalho de poeta e tradutor. Essa produção encontra-se disponível em quatro livros de ensaios, a saber, Participação da Palavra Poética, 1966; Crítica Clandestina, 1986; Jogos e Enganos, 1995; e Crítica de Ouvido, 2003. Em Participação da Palavra Poética, Leite analisa cronologicamente obras de diversos poetas brasileiros, de Gregório de Matos a contemporâneos seus, como João Cabral de Melo Neto e os concretistas, a partir do conceito de participação, detectando em suas obras um maior ou menor grau participativo, isto é, crítico, face à realidade. Vinte anos depois foi a vez de Crítica Clandestina, que adota o gênero ensaio em sua radicalidade e apresenta uma prosa irônica que, além de tratar de temas como a crítica de Octavio Paz e Otto Maria Carpeaux, a prosa de Leopardi e a poesia de Marianne Moore, transita por diversas linguagens artísticas, como a música, a tradução e até as histórias em quadrinhos. Já em Jogos e Enganos, Leite adensa suas reflexões anteriores e introduz nas suas análises o conceito de jogo para abarcar antinomias estruturais – como verdade e mentira; e realidade e ficção – nas suas análises. Nesse volume, abordagens sobre os quadrinhos de Winsor McCay e obras cinematográficas variadas, com vasto material fílmico, encontram-se no mesmo plano de análise de obras poéticas, como a de François Villon, por ele traduzida, e ensaísticas, como a de Elias Canetti. No livro póstumo, Crítica de Ouvido, dividido em três partes distintas, “De poesia e de poetas”, “De prosa e de crítica” e “Imagem e linguagem”, o poeta mais uma vez prima pela variedade de temas apresentados e a capacidade de transitar entre linguagens variadas. A comunicação a ser apresentada pretende traçar não apenas as linhas gerais de um método próprio na prosa ensaística de Sebastião Uchoa Leite como também situá-la no eixo de debates sobre a crítica literária brasileira a partir da contribuição da tradição do poeta-crítico no Brasil, intento da pesquisa de pós-doutorado em curso, “O poeta-crítico no Brasil: tradição e contemporaneidade – ensaísmo crítico de poetas na literatura brasileira dos séculos XX e XXI”.