Em 2014, publicou-se no Brasil e em Portugal o romance inacabado Alabardas, de José Saramago. Publicada postumamente, a edição conta com três capítulos [supostamente (?)] concluídos e revisados por Saramago; ilustrações de Günter Grass; o diário de Saramago referente ao tempo em que trabalhou no romance e, na edição portuguesa, ensaios de Fernando Gómez Aguilera e Roberto Saviano, aos quais se soma, na edição brasileira, o ensaio de Luiz Eduardo Soares. A peculiaridade das edições, especificamente pelos paratextos editoriais, aqui analisados sob a luz dos estudos de Gérard Genette (2009), em Paratextos editoriais [mormente como materializam o texto por meio do processo editorial; como condicionam a leitura e, antes ainda, o/a próprio/a leitor/a, no sentido de que conduzem para uma legitimidade do texto literário], reportam para questões relevantes na temática das textualidades contemporâneas. A partir da discussão sobre autoria – em especial a análise de Roger Chartier (2014) que, ao revisitar a conferência de Michel Foucault (2001 [1969]) O que é um autor?, sugere que a autoria seja elevada à “dimensão da própria materialidade dos textos, [...].” (2014, p. 62), de modo que “os novos leitores tornam novos os textos, e que o novo sentido que lhes é dado é devido à sua nova forma.” (2014, p. 62) – a presente comunicação pretende refletir em que medida o editor, na edição de um romance inacabado e póstumo, por meio dos paratextos editoriais, pode ser percebido como mediador e indicador de uma possibilidade de leitura. Nesse sentido, o editor adquire status de adaptador, no que se refere ao conceito de adaptação apresentado por Linda Hutcheon (2013) em Uma teoria da adaptação, qual seja, a de “um ato criativo e interpretativo de apropriação/recuperação” (2013, p. 30). Conforme Hutcheon, “a adaptação é uma derivação que não é derivativa, uma segunda obra que não é secundária – ela é a sua própria coisa palimpséstica.” (2013, p. 30). Em consequência, o editor pode ser visto, então, como o adaptador do que lhe vem às mãos para publicação. Se, para Chartier (2014), a autoria passa a ser cunhada pela materialidade do texto, há que se pensar nos paratextos editoriais como instrumentos de concretização do texto. Daí a relação do editor com o autor analisada pelo viés da adaptação enquanto palimpsesto. Ao pensar no editor, o objetivo não deixa de ser o de pensar no/na leitor/a, visto que este/esta é quem recebe o texto. A investigação acerca da relação entre autor e editor volta os olhos, sobretudo em como o/a leitor/a tornará novo, pelo exercício da leitura, o texto materializado em livro, ou ainda, receberá o que outrora era visto apenas como fragmento – três capítulos de um romance inacabado – agora como um texto que se concretizou em livro [pela criação e/ou adaptação editorial] viabilizando, assim, possibilidades de leituras.
Palavras-chave: ALABARDAS, DE JOSÉ SARAMAGO, LEITURA, PARATEXTOS EDITORIAIS, ROMANCE INACABADO