Neste trabalho, discutiremos a idéia da literatura como um discurso que produz conhecimento e cujo horizonte é sempre interdisciplinar. O teórico francês René Girard (1923-), autor de uma teoria que ele denominou teoria mimética, inicia suas reflexões através da leitura de romances modernos. A partir dos romances O Vermelho e o Negro, de Stendhal, Em busca do tempo perdido, de Proust, Madame Bovary, de Flaubert e Dom Quixote, de Cervantes, e Os irmãos Karamazov, Memórias do Subsolo e Os demônios, de Dostoievski, Girard percebe na literatura desses autores um enfoque particular que dispara sua teoria sobre o desejo humano. Nos referidos romances, o desejo das personagens não é apresentado como um desejo autônomo, fruto de uma subjetividade auto-centrada e auto-suficiente, e sim a partir de uma subjetividade que implica o desejo de um Outro, que o personagem elegeu como modelo e de quem copia o desejo. Configura-se uma relação triangular entre um sujeito, um modelo e o objeto que esse modelo deseja, que é também desejado pelo sujeito; relação percebida, por exemplo, nos triângulos amorosos. Ao separar escritores românticos de escritores romanescos, Girard inicia, em Mentira romântica, verdade romanesca (1961) uma longa reflexão estendida por toda a sua obra, dialogando com a antropologia, a psicanálise e a filosofia a partir da intuição do desejo mimético que ele extrai da leitura de romances modernos. Essa forma de trabalho interdisciplinar de Girard implica, em sua obra, diálogos entre a literatura e a filosofia, entre a literatura e a antropologia e entre a literatura e os estudos bíblicos, revelando no campo literário uma dimensão interdisciplinar que será discutida enfocando a literatura como produtora de conhecimento. O corpus comenta a teoria mimética, um poema (Carlos Drummond de Andrade) e reflexões filosóficas (E. M. Cioran) com o objetivo de refletir sobre a literatura e o conhecimento.
Palavras-chave: René Girard, desejo mimético, estudos literários.